Por omissão de socorro, a Prefeitura de Palmital e duas enfermeiras do Centro de Saúde da cidade foram condenadas a pagar, solidariamente, R$ 62 mil reais de indenização por danos morais à mãe de um pedreiro que faleceu em 2006. A sentença é do juiz André Luiz Damasceno, da 2ª Vara Judicial de Palmital, município que fica a 410 km da capital. Tanto a procuradoria, quanto o advogado da mãe, já adiantaram que vão recorrer da decisão.
Foi numa sexta-feira, 17 de fevereiro, uma semana antes do carnaval de 2006, que o pedreiro Nivaldo da Silva Rodrigues, começou a passar mal. Indisposto, logo pela manhã o rapaz procurou atendimento hospitalar sentindo fortes dores na cabeça e no peito. De bicicleta, foi primeiro ao posto de saúde mais próximo da sua casa, onde não havia médicos para atendê-lo. Em seguida, foi orientado a procurar o Centro de Saúde de Palmital. Ali, Nivaldo foi recebido por uma funcionária do estabelecimento que negou o fornecimento da senha para que o paciente pudesse ser consultado com o médico de plantão. Alegando ter seguido ordens de suas superiores — as duas enfermeiras condenadas neste processo judicial —, a funcionária afirmou que Nivaldo deveria voltar ao “postinho” para pegar um “encaminhamento”, uma espécie de autorização que lhe desse o direito de ser atendido no Centro de Saúde. No caminho de volta, Nivaldo passou mal e veio a falecer sem atendimento médico.
No entendimento do juiz, ficou comprovado que as duas enfermeiras se omitiram, voluntariamente, em prestar o devido socorro à vítima. “Por meio de ordens suas, impediram que o paciente recebesse atendimento médico”, anotou o magistrado. Para ele, as rés sabiam que não havia médicos no primeiro posto de saúde, mas insistiram que Nivaldo voltasse lá, simplesmente porque ele residia na região atendida pelo estabelecimento. Como as duas funcionárias são servidoras públicas municipais, o juiz entendeu que o município de Palmital também deveria ser responsabilizado pela morte de Nivaldo, que padecia de câncer de cólon.
Em sua defesa, as enfermeiras alegaram que a vítima não se queixou de estar passando mal quando chegou ao Centro de Saúde. Além disso, argumentaram que não há provas de que a omissão foi motivo determinante para causar a morte do rapaz.
Mínima chance de sobrevivência
“Não é crível que alguém tenha procurado atendimento médico hospitalar, sendo portador de ‘câncer’, e que, cerca de 30 minutos após passar pelo Centro de Saúde, tenha vindo a falecer, não estivesse passando mal”, argumentou o juiz Damascena.
Uma testemunha ouvida pela Justiça afirmou que Nivaldo chegou ao Centro de Saúde alardeando que se sentia mal. “Estou aqui a noite inteira, e não estou passando bem”, teria dito. Em resposta, a funcionária disse que não poderia fazer nada pois estava “cumprindo ordens”.
Em depoimento, o médico plantonista que atendeu Nivaldo — depois de ele já ter sofrido a parada cardiorrespiratória — disse que dores no peito e na cabeça podem ser sinais de que a pessoa virá a ter alguma enfermidade cardíaca. No entanto, é impossível dizer que a omissão de socorro foi o que causou a sua morte. “É muito relativo e não é possível afirmar que uma vez socorrido com os primeiros sintomas [o paciente] viesse a não sofrer o evento fatal, mas existe essa possibilidade”, disse o médico.
“Foi retirada qualquer mínima chance de sobrevivência”, argumentou o juiz. Dessa forma, entende o magistrado, é cabível o ressarcimento pelos danos morais causados, pois as duas enfermeiras e a Prefeitura minaram qualquer possibilidade de tratamento para salvar Nivaldo.
Recursos
Na inicial, o advogado Rodolfo Branco Martins havia pedido que a Justiça reconhecesse os danos morais e materiais causados à mãe de Nivaldo. No total, a defesa estimou em R$ 350 mil a indenização a ser paga pelas rés.
O juiz Damascena, entretanto, julgou procedente apenas o ressarcimento por danos morais, arbitrando em cem salários mínimos o valor da multa. No que se refere aos danos materiais, o magistrado não entendeu que ficou comprovado que a mãe de Nivaldo era dependente financeiramente do filho. Portanto, não concedeu o ressarcimentos pelos lucros cessantes.
Após a decisão de primeira instância, o processo será automaticamente remetido ao TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo), por se tratar de um caso envolvendo a Fazenda Pública.
Ao Última Instância, Rodolfo Martins adiantou que também vai apelar da decisão de primeiro grau. Além da majoração da indenização por danos morais, o advogado também vai pedir que seja reconhecido que Nivaldo era quem sustentava a mãe. “A unidade familiar eram eles dois: mãe e filho, que viviam sob o mesmo teto”, argumentou o advogado, que vai pedir a concessão dos lucros cessantes.
Carlos Alberto Pedrotti de Andrade é advogado e diretor do Departamento de Negócios Jurídicos do município de Palmital. Ao lado da procuradoria, ele é responsável pela defesa da Prefeitura e das duas enfermeiras. Como o recurso é automático, Pedrotti afirmou que, apoiado em laudos periciais, irá apresentar novas fundamentações para pedir a improcedência da ação indenizatória.
Número do processo: 415.01.2007.001553-6