Redação G1
A sentença de um juiz de Porto Alegre está provocando polêmica entre advogados e também entre leigos em direito nas redes sociais. Nela, o magistrado cita palavras da atriz global Paolla Oliveira para ajudar a fundamentar a condenação de um jovem por tráfico de drogas na capital gaúcha.
O documento é de março deste ano, mas só começou a ganhar repercussão a partir da postagem de um trecho no Facebook na quinta-feira (29). Até as 18h desta sexta (30), a publicação há havia sido compartilhada por mais de 3,3 mil pessoas e comentada por outras 45.
A declaração da intérprete de Paloma na novela “Amor à Vida” foi extraída de uma entrevista concedida por ela à revista Marie Clarie, com data de março de 2011. Na ocasião, Paolla Oliveira se manifestava sobre a ocupação policial do Morro do Alemão, no Rio de Janeiro.
“Direitos Humanos é para quem sabe o que isso significa. Não para quem comete atrocidades de forma inconsequente”, diz o trecho destacado na sentença assinada pelo juiz de direito Alex Gonzalez Custodio.
Ao ser avisado por amigos sobre essa sentença, o advogado Thiago Machado, também de Porto Alegre, decidiu reproduzir na internet a parte do texto que mais o intrigou. Segundo ele, a intenção é promover um debate sobre uma suposta “carência técnica” do Judiciário.
“A ideia era expor uma carência de técnica jurídica que se expressou em uma sentença criminal, mas que vários colegas de várias áreas do direito têm se deparado e que põe o Judiciário em descrédito. Minha irresignação foi para levar aos colegas a problemática da carência e as consequências maléficas, especialmente ao processo penal, e também a falta de comprometimento técnico com a nobre função de julgar”, explicou ao G1.
Com 50 anos de idade e 18 anos de magistratura, o juiz Custodio, titular da 1ª Vara Criminal do Foro Regional da Tristeza, na Zona Sul da capital, diz que não vê nenhum problema em usar a declaração da atriz. Segundo ele, o trecho é apenas um ponto de uma longa argumentação, expressa nas 15 páginas da sentença.
“O rapaz (advogado) teve o seu momento de celebridade nas redes sociais. Acho que ele não leu toda a sentença. Eu não vejo polêmica. É apenas um elemento dentro de um contexto maior. Eu falava sobre a questão dos direitos humanos, que muitas vezes supervalorizam os réus e esquecem das vítimas, muitas delas sequeladas, traumatizadas e violentadas em sua integridade física pela criminalidade na nossa sociedade”, rebateu o juiz.
Segundo Custodio, o réu no processo foi detido pela polícia portando quase 400 pedras de crack, mas a defesa dele alegou que as drogas eram para consumo próprio. Na sentença, o juiz fixou a pena de sete anos de reclusão em regime fechado ao jovem de 21 anos (à época do fato), por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Ele continua preso.
Não é a primeira vez que uma sentença do juiz Alex Gonzalez Custodio repercute fora do Judiciário. Em maio, ele condenou em primeira instância o ex-jogador de futebol e empresário Assis Moreira – irmão de Ronaldinho Gaúcho – a pagar R$ 500 mil de indenização a um casal de vizinhos, por danos causados na propriedade deles provocados pela queda de um muro.
No texto, o magistrado reclamou da dificuldade em notificar o réu durante o processo e escreveu que a família Moreira acredita estar “acima da lei e da Justiça” por se considerar “melhor do que os simples mortais” e colocar a fama e o dinheiro à frente dos “princípios de humanidade e solidariedade”. A 19º Câmara Cível do Tribunal de Justiça manteve a condenação no julgamento do recurso.