Camila Campanerut
Do UOL, em Brasília
O presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Hereda, afirmou nesta segunda-feira (27) que houve antecipação no calendário de pagamentos dos recursos públicos federais vinculados ao Bolsa Família sem anúncio para as famílias beneficiárias nem conhecimento da própria direção do banco.
Essa informação foi divulgada em uma reportagem publicada no jornal Folha de S.Paulo no último sábado (25). Só então o banco convocou uma entrevista coletiva para dar explicações sobre o caso e admitiu as falhas na transmissão da informação.
“Tive a informação na segunda-feira (20) durante o dia [de que os pagamentos estavam sendo feitos desde o dia 17 de maio] e mandei fazer levantamento exaustivo para saber o que ocorreu”, disse o presidente.
O presidente da Caixa e o vice-presidente da área de Governo e Habitação do banco, José Urbano Duarte, alegaram que a área operacional iniciou o pagamento do Bolsa Família na sexta-feira (17) para cumprir um cronograma de renovação do cadastros das famílias e que isso não era de conhecimento da diretoria.
A Caixa teria identificado que 692 mil beneficiários tinham dois registros no programa. Segundo a instituição, para evitar que com a atualização do sistema interno do banco os beneficiários pudessem ficar sem receber, foi feita uma liberação do saque irrestrito.
No dia 17 o sistema permitia a liberação para todos os beneficiários. Ele reconheceu que não teve informação de seus subordinados sobre a mudança de data.
Hereda argumentou que a informação equivocada ocorreu em uma situação de crise. “A Caixa não mentiu. Tivemos uma informação equivocada com relação à data em que se abriu o sistema [de pagamento]. Foi uma informação imprecisa da Caixa, mas essa imprecisão só se justifica pelo momento que estávamos vivendo”, declarou. Ele pediu desculpas pelos dados incorretos.
O presidente disse que foi após uma avaliação interna que a decisão de liberar os recursos antes sem divulgação foi feita, para não “preocupar as famílias”.
Hereda disse, no entanto, que acredita que a alteração no sistema interno não teve relação com a boataria sobre o fim do Bolsa Família e salientou que todos os pagamentos solicitados pelos beneficiários foram feitos.
Ele não quis se manifestar sobre a motivação dos boatos, mas disse que foi a informação do fim do pagamento do benefício que levou ao corre-corre atrás do recurso. “A única coisa que faria as pessoas irem correndo [às agências] era o fato de terem medo de que isso [o programa] tivesse acabado. Eu acho perfeitamente óbvio”, declarou. “A politização não foi a falta de informação [da Caixa]. Não foi feita pela Caixa. Não estamos entrando neste mérito.”
O presidente da Caixa disse que, se for chamado, irá ao Congresso dar explicações sobre o caso. O PSDB entrou com um pedido no Ministério Público Federal de investigação sobre a mudança. Também solicitou à Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle do Senado para que convidasse o presidente da Caixa para se manifestar.
A presidente Dilma chegou a chamar os boatos de “desumanos” e “criminosos”. Já a ministra da Secretaria dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, chegou a postar no Twitter que os rumores deviam “ser da central de notícias da oposição”, depois voltou atrás.
Em evento em São Paulo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou como “ato de vandalismo” e “brincadeira de mau gosto” os boatos sobre o fim do Bolsa Família. Contudo, o ex-presidente evitou comentar a atitude de hoje do banco no episódio.
Linha de investigação
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, confirmou na noite desta segunda-feira (27) que uma das linhas de investigação da Polícia Federal sobre os boatos do fim do Bolsa Família se baseia em uma testemunha no Rio de Janeiro que disse ter recebido um telefonema com a informação de que o programa iria acabar.
“Se é uma empresa, se não é uma empresa, se é de telemarketing, isso está sendo objeto de investigação”, afirmou em entrevista coletiva.
Segundo Cardozo, a informação da testemunha chegou à PF via TV Globo, que, durante uma reportagem, colheu esse depoimento.
“A linha de investigação por linha telefônica se origina de informações vinda da própria imprensa”, resumiu o ministro. “Não se afasta a priori a possibilidade de que houve uma ação orquestrada. Não se confirma nem se afasta [esta possibilidade]”, completou.
O material, recebido pela Polícia Federal na segunda-feira passada (20), está sendo verificado.
No fim de semana dos dias 18 e 19 de maio, boatos sobre o fim do programa Bolsa Família e sobre um suposto bônus pelo Dia das Mães provocaram pânico entre os beneficiários e uma corrida a agências da Caixa em 13 Estados –Pará, Piauí, Paraíba, Bahia, Pernambuco, Ceará, Maranhão, Alagoas, Sergipe, Rio Grande do Norte, Amazonas, Tocantins e Rio de Janeiro. Foram sacados cerca de 900 mil benefícios, num total de R$ 152 milhões pagos somente entre sábado e domingo.
Segundo a Caixa, o Bolsa Família atende a 13,8 milhões de famílias, num total de 50 milhões de beneficiados. Até abril deste ano, foram pagos 52,2 milhões de benefícios, num total de R$ 7,6 bilhões desembolsados.
O dia do pagamento dos beneficiários consta no cartão e segue do dia 1º ao dia 10 de cada mês. A média de recebimento por dia de pagamento é de 886 mil beneficiários nos dez primeiros dias de todos os meses. (Com reportagem de Janaina Garcia, em São Paulo)