por Silvia Amorim, O Globo
Na semana em que o presidente interino Michel Temer cedeu à pressão de pequenos partidos da Câmara para nomear um deputado réu em ações penais como líder do governo, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse em entrevista para falar de seu novo livro “Diários da Presidência — 1997 a 1998″ que um presidente “não pode deixar o Legislativo montar no cangote do Executivo”.
No livro, o sr. fala da aprovação da reeleição, denúncias de compra de voto, crises internacionais e a eleição. Foi o período mais difícil da sua gestão?
1998 foi o mais difícil e 1999 também. Tinha a crise da Rússia, a situação econômica piorava gradativamente e tínhamos eleição. Havia muita gritaria sobre desemprego e muita pressão política.
O sr. disse ao GLOBO que ministro que se tornar réu tem que ser afastado.
(A nomeação) é insustentável. Eu não acompanhei, mas reclamaria.
Na negociação com o PMDB para nomear Eliseu Padilha (atual titular da Casa Civil) como seu ministro, o sr. diz no livro que a pressão estava “cheirando mal”. O que quis dizer?
Eu não tinha nada contra o Padilha. O problema era a forma. Era um “tem que ser, tem que ser’’. Não gostei. Você não pode deixar o Legislativo montar no cangote do Executivo, porque este corcoveia e tem que se equilibrar senão cai.
É a situação do Temer?
Não. Ele está tentando manter os partidos agrupados porque tem votação de impeachment. Ele não tem outra alternativa porque precisa do Congresso mais do que eu e o Lula precisamos. Mudou a pessoa lá de cima mas o sistema político não foi quebrado.
Temer tem força e disposição para uma reforma política?
Espero que sim. Mas não podemos esquecer que é um governo de transição. Para levar adiante muitas das transformações necessárias é preciso alguém com voto, força e agenda.
Após 13 anos o PSDB deixa de ser oposição, mas sem ser governo. O sr. já disse “esse governo não é nosso”. Essa crise de identidade não pode levar a uma perda de protagonismo dos tucanos na eleição?
Esse é um ponto delicado porque até hoje o jogo partidário no Brasil se deu entre PT e PSDB. Agora o PMDB começa a querer entrar. Ou o PSDB volta a afirmar alguns propósitos programáticos ou ele vai ser confundido com o partido do poder. É uma operação delicada porque o PSDB não pode deixar de ajudar a transição e tem que olhar a sucessão de 2018. Nesse momento estamos com muitas dúvidas sobre quais vão ser os polos aglutinadores do futuro.
Não tende a ser PT e PMDB?
Isso vai depender da capacidade do PSDB de ter um projeto. O que não pode deixar é se dissolver no marasmo da política do toma la dá cá. Não importa o que digam, é melhor estar em cima do muro do que cair na lama.
Quais mudanças defende para a Previdência?
Defendo que para algumas categorias de trabalhadores haja uma idade mínima menor para a aposentadoria. Agora, é irracional mulher se aposentar mais cedo se vive mais do que o homem. Não acredito que uma reforma completa que atenda às finanças vai ser aprovada.
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