A reforma administrativa que vem sendo implementada pelo governador Jackson Barreto não pode sacrificar a Companhia de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Irrigação de Sergipe – Cohidro, sob pena de colocar em sério risco o setor de agricultura irrigada do estado, com consequências graves para milhares de agricultores, suas famílias e para a mesa dos sergipanos, com o possível encarecimento dos produtos agrícolas.
O alerta é da Associação dos Servidores da Cohidro – ASC – e do Sindisan, sindicato que agrega os servidores da empresa. Segundo o presidente da ASC, Alberto Santos Melo, a reforma administrativa em andamento sinaliza para a extinção de várias empresas públicas do Estado, recentemente o Conselho de Administração da Companhia de Saneamento de Sergipe – Deso – e os seus acionistas aprovaram a criação, dentro da sua estrutura, da Diretoria de Irrigação e Sistemas Simplificados, indicando que a estrutura da Cohidro deve ser absorvida pela Deso.
“É o que tudo indica que irá acontecer. Mas é preciso deixar claro para a sociedade que a Deso trabalha com a captação, tratamento e distribuição de água potável, inclusive atendendo a resoluções estabelecidas pela Agência Nacional de Águas (ANA). Penso que a Deso não tem como trabalhar com perfuração de poços com barragens e perímetros irrigados, fornecendo água gratuitamente para os agricultores como faz a Cohidro. A Deso vende água tratada para consumidores que pagam por ela. É completamente diferente do que fazemos na Cohidro”, explica Alberto Santos Melo.
Para Alberto, por ter natureza de operações distintas, provavelmente a Deso terá que cobrar pelos serviços de perfuração de poços (para comunidades e pequenos agricultores), a assistência aos perímetros irrigados e a construção de cisternas e aguadas – em Sergipe, a Cohidro já construiu 5 mil cisternas e mil aguadas de forma gratuita para os beneficiados. O Presidente da ASC lembra que há aproximadamente quinze anos, por decisão política, os serviços de irrigação passaram a ser prestados a custo zero.
“Particularmente não somos favorável ao subsídio total. Entretanto, reconhecemos que este contribui para que a cesta básica dos sergipanos seja a mais barata do país, segundo dados do Dieese. Qualquer mudança nessa política implicará, com certeza, no aumento dos alimentos agrícolas na mesa dos sergipanos, já que de cada dez hortaliças consumidas em Sergipe, sete vêm dos perímetros irrigados administrados pela Cohidro”, destaca Melo.
Dados da ASC apontam que, graças ao trabalho da Cohidro, que tem atuação em todos os municípios, Sergipe é o estado que, proporcionalmente, detém a maior densidade de poços perfurados por quilômetro quadrado do Brasil, com cerca de 4 mil poços tubulares que disponibilizam, em média, 12,5 mil litros/hora de água de boa qualidade em locais onde não existe adutoras da Deso, beneficiando cerca de 200 mil pessoas.
Ainda segundo os dados, somente em 2014, os perímetros irrigados administrados pela Cohidro produziram 113, 8 mil toneladas de alimentos, gerando uma receita aos pequenos produtores de R$ 104,4 milhões.
Demissões
De acordo com o presidente da ASC, Alberto Melo, ainda que a estrutura da Cohidro seja toda ela aproveitada numa possível fusão, a Deso precisaria dos profissionais que hoje atuam na empresa de recursos hídricos e irrigação. Entretanto, ele não vislumbra como a Deso incorporará o quadro de servidores da Cohidro que é de aproximadamente 450 servidores.
“Essa é outra grande preocupação nossa. Não vejo como o governo construir essa transição sem demissões. A extinção de uma empresa, por força de lei, implica em demissões. Não tem mágica. Temos na Cohidro profissionais altamente qualificados e valorosos que, muito provavelmente, serão demitidos. E como ficarão esses companheiros e as suas famílias?”, questiona Alberto.
Ele lamenta, ainda, a falta de informações mais precisas sobre o futuro da Cohidro. Nos corredores da empresa, a tensão é grande entre os trabalhadores face o clima de incertezas. “Assim como muitos companheiros daqui, não tenho dormido diante dessa questão: se a Cohidro for extinta, de que forma os servidores serão tratados pelo governo?”.
Objetivos diferentes
Para Sérgio Passos, presidente do Sindisan, a Cohidro precisa ter a sua estrutura preservada como empresa, pelos serviços relevantes que presta à agricultura, aos agricultores e à economia do estado de Sergipe. Em sua opinião, o trabalho da empresa não pode se confundir com o da Deso, que tem objetivos diferentes.
“Os serviços que a Deso presta tem cunho comercial, ou seja, é de coletar, tratar e vender a água e cobrar também pelo esgoto gerado. Já o trabalho da Cohidro é de cunho social e tem forte impacto na mesa da população e até na merenda escolar que é servida nas nossas escolas. O que nós queremos é que, assim como a Deso, a Cohidro seja preservada, reestruturada e valorizada junto com os seus servidores. Basta dessa política tacanha de desmonte das estruturas essenciais para a sociedade e de prejuízo para os trabalhadores”, critica Passos.
O sindicalista ainda questiona o porquê de o Estado querer abrir mão de uma empresa estratégica como a Cohidro diante de um cenário de escassez de água em várias regiões do País e de crise econômica aguda, o que aponta para a necessidade de mais investimentos no setor, e não de enxugamento.
“O País está atravessando, para além de uma crise hídrica, uma grave crise econômica. E todos nós sabemos que quem segura a nossa economia é a agricultura. Esta crise só não está pior por causa da nossa agricultura. Como é que o governo de Sergipe tem uma empresa estratégica como a Cohidro, com toda uma experiência acumulada ao longo dos seus 32 anos de serviços prestados, e quer extingui-la? Se a agricultura é o motor da nossa economia, o correto é fortalecê-la”, enfatiza Sérgio Passos.
Empresa estratégica e viável
Ainda de acordo com dados levantados pela ASC, a Cohidro tem cumprido um papel fundamental não só na agricultura, como na piscicultura e na pecuária sergipana. Além do Platô de Neópolis e dos seis Perímetros Irrigados – Califórnia (Canindé do São Francisco), Piauí (Lagarto), Jabiberi (Tobias Barreto), Ribeira e Jacrecica I (Itabaiana) e Jacarecica II (Malhador), a Cohidro também contribui com a piscicultura do estado, na produção de cerca de 300 toneladas de peixes (tambaquis e tilápias) por ano nos territórios do Agreste Central, Leste Sergipano e do Baixo São Francisco.
A empresa desenvolve ações, ainda, na área de meio ambiente, através do plantio de mudas para reflorestamento nos perímetros irrigados, visando à recuperação das matas ciliares, e, desde o ano passado, ajuda no incremento da bacia leiteira no perímetro irrigado Jabiberi, em Tobias Barreto, beneficiando 74 produtores com o Programa Balde Cheio, que tem produção anual de 1, 225 milhões litros de leite e 122 mil quilos de queijo.
A Cohidro é viável do ponto de vista gerencial e social, firmando convênios importantes e recebendo financiamentos externos, federais e internacionais, com objetivos estratégicos de fortalecimento da agricultura, da oferta de segurança hídrica e geração de empregos e de renda, evitando o êxodo rural para as grandes cidades.
Somente nos últimos três anos, a empresa conseguiu captar recursos na ordem de R$ 65 milhões dentro do Programa Água de Sergipe (Banco Mundial), Proinvest (Governo Federal) e convênios com a Petrobras, Ministério da Integração Nacional e Secretaria de Inclusão e Desenvolvimento Social – Seides, entre outros.
“O trabalho da Cohidro permite a geração de mais de 32 mil empregos diretos e 86 mil indiretos no campo. É uma empresa estratégica e viável que só precisa ser reestruturada e implantar uma política de valorização dos seus servidores, não o inverso, como vem ocorrendo sistematicamente”, saliente Alberto Melo.
“Qual será o futuro dos perímetros irrigados e dos agricultores caso a Deso assuma os serviços prestados pela Cohidro, se o objetivo principal da Deso é captação de água para consumo humano? Este governo sacrificará a Cohidro à custa de uma tão falada economia para o Estado que ninguém consegue enxergar? A sociedade precisa compreender o que está em jogo. Precisamos da Cohidro fortalecida e não extinta”, enfatiza o presidente da ASC.
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Por GEORGE W. SILVA