Por Raphael Andriolo e Thierry Gozzer
Globo Esporte/Rio de Janeiro
Há dois anos, a medalha de ouro escapou das mãos de Rafaela Silva. Ela viu a japonesa Aiko Sato ocupar o lugar que ela queria estar e teve que se contentar com a prata no Mundial de Paris. No ano passado, chegou com grandes chances às Olimpíadas de Londres, mas viu seu mundo desabar com a eliminação por conta de um golpe proibido. Quis o destino que a carioca da Cidade de Deus entrasse para a história do judô brasileiro dentro de casa, no Maracanãzinho, diante de uma torcida barulhenta. Com menos de um minuto de luta ela aplicou um ippon na americana Marti Malloy e se tornou a primeira mulher brasileira campeã mundial no judô.
– O último Mundial bateu na trave, entrei dessa vez para levar a medalha na minha casa, na minha cidade. Eu não podia deixar meu braço esticado e nem ir para o chão. No Pan-Americano por equipes, perdi para ela no chão. Pensei: “vou entrar, vou ficar bem justa”. Eu vi que ela caiu, mas, no momento, do jeito que ela caiu, tentei pegar o braço. Olhei para a mesa, e o árbitro resolveu dar o ippon – disse Rafaela ao SporTV, ainda sem acreditar no que tinha feito dentro do tatame.
Dessa vez, o choro não foi de desespero nem de tristeza. A menina de 21 anos chorou de alegria. Antes dela, apenas João Derly, duas vezes (2005 e 2007), Tiago Camilo (2007) e Luciano Correa (2007) haviam subido no lugar mais alto do pódio em um Mundial de judô.
Foi a terceira medalha do Brasil em três dias de competição. Na segunda, a campeã olímpica Sarah Menezes conquistou o bronze entre os ligeiros. Na terça foi a vez de Érika Miranda levar a prata no meio-leve. E agora Rafaela Silva é ouro no peso leve. O SporTV transmite o Mundial do Rio ao vivo, e o GLOBOESPORTE.COM acompanha tudo em Tempo Real com vídeos.
O caminho até o ouro inédito
Rafaela Silva começou o dia justamente lutando contra uma americana. Hana Carmichael fez jogo duro, dificultou a vida da brasileira, mas não conseguiu evitar os dois yukos que deram a vitória para Rafaela. Em casa, ela ia ganhando confiança à medida que a torcida gritava seu nome no Maracanãzinho. No entanto, a luta mais dura ainda estava por vir. Contra a romena Loredana Ohai, muita emoção, de levantar o torcedor na arquibancada.
As duas chegaram ao terceiro minuto de luta, dos cinco totais, sem pontuar, mas a romena tinha duas punições, contra apenas uma da brasileira. Faltando pouco mais de um minuto para o fim do combate, Loredana conseguiu um yuko, e Rafaela se viu em desvantagem. Abriu os braços, reclamou da pontuação contra e perdeu a concentração. Com isso, entrou nos segundos finais precisando encaixar um golpe perfeito ou quase perfeito para não ser eliminada em sua própria casa. Mas a 15 segundos de o cronômetro zerar veio o wazari salvador, que a colocou à frente do marcador novamente e a classificou para as quartas de final.
A vaga na semifinal veio em um reencontro Brasil x Kosovo. Se na terça-feira Érika Miranda perdeu o ouro para Majlinda Kelmendi, nesta quarta Rafaela Silva não deu chances para Nora Gjakova. A atleta do Kosovo bem que tentou, mas a carioca aplicou um ippon ainda no início do combate e avançou para enfrentar a número um do mundo da categoria na semi, a francesa Automne Pavia.
O histórico entre Pavia e Rafaela era equilibrado. Uma vitória para cada lado. E assim foi a luta. As duas disputavam pegada e não atacavam. O árbitro aplicou duas punições para cada uma. O duelo continuou truncado, mas a brasileira conseguia aplicar alguns golpes. Foi quando uma entrada encaixou, e a carioca conseguiu um wazari, imobilizou, deixou a francesa escapar e pegou o braço para uma chave. A francesa deu a batida indicando fim de luta, mas o juiz não viu, apesar dos apelos de Rafaela (veja o vídeo ao lado). A luta seguiu, mas não havia mais tempo para reação. A brasileira estava mais uma vez na decisão de um mundial, dois anos depois de Paris.
Tudo conspirava a favor da brasileira, judoca do Instituto Reação, projeto criado por Flávio Canto, medalhista olímpico na modalidade e hoje apresentador. No retrospecto entre Rafaela e Malloy, goleada. A carioca já havia lutado com a americana sete vezes e vencido seis – inclusive uma este ano, no Pan de San José. E a vantagem foi ampliada: 7 a 1. Rafaela precisou de menos de um minuto para jogar a rival no chão. Mas teve que esperar para comemorar. O árbitro assinalou wazari. Mas, depois de ouvir os árbitros da mesa por um ponto eletrônico, corrigiu a marcação e deu ippon. Rafaela chorou antes mesmo de o juiz confirmar a vitória: enfim, podia gritar que era campeã mundial.
Mais cedo, na mesma categoria que Rafaela, Ketleyn Quadros foi eliminada após vencer a húngara Hedvig Karakas na estreia. Ela caiu justamente diante da americana Marti Malloy, medalha de prata. Bruno Mendonça também perdeu e não foi ao pódio. Ele venceu as duas primeiras lutas contra Felipe Caceres, do Chile, e Terence Junior Kouamba Poutoukou, do Gabão, mas foi eliminado por Aliaksei Ramanchyk, de Belarus.
Nesta quinta-feira é a vez dos judocas da categoria meio-médio entrarem no tatame. Victor Penalber, líder da categoria até 81kg, e Katherine Campos, até 63kg, competem no Mundial.
Classificação categoria leve feminino (57kg)
1° Rafaela Silva (BRA)
2° Marti Malloy (EUA)
3° Vlora Bedeti (ESL)
3° Miryam Roper (ALE)
Classificação categoria leve masculino (73kg)
1° Shohei Ono (JPN)
2° Ugo Legrand (FRA)
3° Dex Elmont (HOL)
3° Dirk Van Tichelt (BEL)