Do G1, em Brasília
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não quis comentar nesta terça (11), em Paris, as acusações feitas por Marcos Valério, em depoimento prestado à Procuradoria-Geral da República em setembro, de que ele tinha conhecimento do esquema do mensalão e teria autorizado empréstimos do Banco Rural e do BMG para o PT.
“Não posso acreditar em mentiras”, disse Lula após a abertura do Fórum pelo Progresso Social, evento organizado pelo Instituto Lula e pela fundação francesa Jean Jaurès, em Paris (veja no vídeo acima). O encontro contou com participações do presidente da França, François Hollande, e da presidente do Brasil, Dilma Rousseff.
Segundo reportagem publicada na edição desta terça do jornal “O Estado de S. Paulo”, Valério, apontado como operador do mensalão e condenado a mais de 40 anos de prisão pelo STF, disse que Lula autorizou empréstimos dos bancos Rural e BMG para o PT com objetivo de viabilizar o esquema. Conforme a publicação, o dinheiro também foi usado para pagamento de “despesas pessoais” de Lula.
“O Estado S. Paulo” informa que teve acesso às 13 páginas do depoimento de três horas e meia dado por Marcos Valério no último dia 24 de setembro. De acordo com o texto, Valério procurou voluntariamente a Procuradoria-Geral após ter sido condenado pelo STF pelos crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Em troca do novo depoimento e de mais informações sobre o esquema de desvio de dinheiro público para o PT, Valério pretende obter proteção e redução de sua pena.
Mais cedo, o Instituto Lula informou ao G1 que o ex-presidente não pretende se manifestar sobre a reportagem. Mas, segundo a assessoria do instituto, se mudar de ideia, Lula vai se pronunciar por meio de nota oficial.
Presidente do STF defende apuração
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, afirmou que Ministério Público deve apurar a acusação, feita por Marcos Valério, de que Lula sabia do esquema do mensalão. Durante intervalo da sessão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ao ser questionado por jornalistas se as acusações deveriam ser investigadas, ele disse: “Eu creio que sim”.
Barbosa não respondeu se considerava a acusação grave e disse que tomou conhecimento “não oficial” do depoimento dado por Marcos Valério. “Tomei conhecimento oficioso, não oficial”.
O ministro Marco Aurélio Mello afirmou que “cabe a quem de direito tomar as providências” sobre o novo depoimento. “Cabe a quem de direito tomar providências. O que se deve destacar é que não há repercussão no processo da AP 470. Caberá ao Ministério Público avaliar. […] Se o procurador entender que há elemento e que deve pedir instauração de inquérito, cabe a ele. Não emito entendimento porque sei do depoimento pelos jornais”, afirmou o ministro.
Procuradoria não vai se pronunciar
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, disse por meio de sua assessoria de imprensa, que não vai se pronunciar sobre o assunto até o final do julgamento no STF. A Procuradoria já havia informado que novas informações repassadas por Marcos Valério não seriam incluídas na ação do mensalão, embora pudessem resultar na abertura de um novo processo em primeira instância, por exemplo.
Autor da denúncia do mensalão, o ex-procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza afirmou que a abertura de um novo inquérito para investigar a eventual participação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no esquema dependeria da apresentação de provas que apontassem a veracidade do depoimento de Valério ao Ministério Público Federal.
“A informação que eu tive é que esse depoimento é baseado no ‘eu acho’, ‘eu vi’, ‘me disseram’. Não sei o que o Ministério Público Federal tem a fazer, mas pelo que vi não tem nem o que fazer porque não tem documentos, não tem a data. Só tem a fala, sem indicação de como confirmar isso, pelo que sondei”, disse.
Oposição quer ouvir Valério
O líder do PSDB no Senado, Álvaro Dias (PSDB-PR), afirmou que vai protocolar convite para que Marcos Valério preste explicações na Casa sobre depoimento dado à Procuradoria-Geral da República. “Vamos criar o fato político no Congresso. Ouvir Marcos Valério é propor transparência, é colocar todo o fato à luz, para que a sociedade possa dele tomar conhecimento”.
O senador Aécio Neves (PSDB-MG) classificou como “graves” as declarações de Marcos Valério e defendeu investigação pela Procuradoria-Geral da República. “[São] graves, na direção daquilo que a imprensa já havia publicado. Cabe a meu ver a PGR analisar que procedimentos tomará em seguida, se há novos indícios que possam modificar sua posição”, disse.
O PPS também cobrou que o Ministério Público abra investigação para apurar o envolvimento de Lula no esquema do mensalão. “Diante das declarações dadas ao Ministério Público não resta outro caminho. É abertura imediata de inquérito”, afirmou o presidente do partido, deputado Roberto Freire (SP).
PT aponta ‘mentiras envelhecidas’
O Instituto Lula informou ao G1 que ele não pretende se manifestar sobre a reportagem. Mas, segundo a assessoria do instituto, se mudar de ideia, Lula se manifestará por meio de nota oficial.
O PT divulgou nota nesta terça lamentando a divulgação pela imprensa do depoimento de Valério à Procuradoria-Geral da República com supostas denúncias contra o ex-presidente Lula. Para o partido, “supostas afirmações” refletem apenas uma “tentativa desesperada de tentar diminuir a pena de prisão que Valério recebeu do STF”.
Segundo a nota, assinada pelo presidente do PT, Rui Falcão, o depoimento é uma “sucessão de mentiras envelhecidas, todas claramente desmentidas”. O partido considerou “lamentável que denúncias sem nenhuma base na realidade sejam tratadas com seriedade”.
Mensalão
Durante os quatro meses de julgamento, o Supremo concluiu que o mensalão foi um esquema articulado de pagamento de uso de recursos públicos e privados para pagamento a parlamentares em troca da aprovação no Congresso de projetos de interesse do governo Lula e condenou 25 dos 37 réus. Segundo a denúncia da Procuradoria Geral da República, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, condenado a mais de dez anos de prisão, foi o “chefe” do esquema, o que ele nega.