Sergipe ainda é um dos estados do Brasil em que nenhum hospital realiza transplante de rim. Dados de fevereiro de 2022, da Secretaria da Saúde estadual, mostram que há cerca de 1.300 pessoas realizando diálise em estabelecimentos de saúde. Quando uma dessas pessoas precisa de um transplante renal, não tem outra opção senão ir a outro estado. No entanto, o HU-UFS/Ebserh está empreendendo esforços para mudar essa realidade: em breve, a instituição vai realizar o primeiro transplante de rim em Sergipe, desde 2012, e tornar-se o único hospital sergipano a fazer o procedimento. Nesta sexta-feira, 27, as instalações hospitalares receberam a visita do cirurgião Mario Nogueira Junior, do Hospital paulistano Albert Einstein, como parte das tratativas de uma tutoria destinada a capacitar os profissionais locais nos transplantes.
O centro hospitalar da Ebserh em Aracaju conta com uma equipe de profissionais experientes coordenada pelo chefe da Unidade do Sistema Urinário, Ricardo Bragança. O urologista explica que o trabalho da tutoria com o Hospital Albert Einstein, resultado de um convênio com o Ministério da Saúde, permitirá o início dos transplantes pelo Sistema Único de Saúde (SUS), inicialmente entre pacientes vivos.
“Assistimos a uma nova etapa. Depois da interrupção, em 2012, da realização de transplantes renais que fazíamos em hospital privado, estamos preparando a estrutura do nosso hospital-escola para retomar essa realidade em Sergipe. É bom para a população, que terá essa opção sem precisar sair do estado. Neste momento, o Hospital Albert Einstein, parceiro do SUS nessa tutoria que oferece aos nossos profissionais, está avaliando como podemos reforçar os serviços implicados e dar a cada membro da equipe a formação adequada”, ressalta Ricardo Bragança.
Parceria com o Albert Einstein
A tutoria prestada pelo Hospital Israelita Albert Einstein é fruto de um convênio com o Ministério da Saúde, que prepara hospitais habilitados no SUS para fazerem transplantes renais com os critérios desejáveis de excelência. No caso do HU-UFS/Ebserh, a parceria começou em 2019, mas a pandemia de covid adiou algumas etapas.
No final de 2021, O HU-UFS/Ebserh retomou a tutoria com algumas partes práticas que estavam pendentes e, em janeiro de 2022, iniciou o ambulatório de transplante pré-renal. “Os pacientes que são candidatos a realizar transplante por doador vivo, que vai ser a modalidade inicial, começaram a ser preparados há alguns meses. Hoje temos algumas duplas que estão preparadas e outras que estão em fase de preparo”, detalha a enfermeira Michelle Cardoso.
Durante a tutoria, a equipe responsável do HU-UFS/Ebserh também visitou as instalações do Albert Einstein e conheceu os protocolos aplicados ao transplante renal naquele hospital, além de poder acompanhar, na prática, a atuação do centro que é considerado referência no Brasil, pelo Ministério da Saúde, para esse tipo de procedimento.
Com o parecer favorável do Albert Einstein, os primeiros transplantes estão previstos para acontecer no mês de julho de 2022, na forma eletiva e entre pacientes vivos, com algum grau de parentesco. “A partir da experiência adquirida, principalmente com os fluxos, poderemos avançar, no futuro, para os transplantes de doadores cadáveres”, prevê Michelle.
O chefe da Unidade do Sistema Digestivo do HU-UFS/Ebserh, Antonio Junior, que compõe a equipe de cirurgiões para os transplantes renais, ressalta que a tutoria só terminará em 2023, já que o objetivo é realizar os cinco primeiros transplantes ainda sob a supervisão do Albert Einstein. “Ao final da tutoria, os participantes estarão plenamente capacitados para a continuidade na realização dos transplantes, o que permitirá atender ao anseio da população sergipana em relação à manutenção frequente e de qualidade de transplantes renais no estado”, opina o gestor.
Avaliação e ajustes finais
O cirurgião e preceptor do Hospital Israelita Albert Einstein, Mario Nogueira Junior, relata que a sua visita ao HU-UFS/Ebserh é uma das etapas da tutoria que busca viabilizar o início do programa de transplantes. “O meu papel é observar se o hospital reúne as condições básicas para a realização de transplantes renais. Além disso, a ideia de programas como esse é que centros de saúde maiores possam passar a experiência a um serviço que está começando”, pontua.
A visita de Mario Nogueira é a última dos profissionais que o Albert Einstein mandou ao HU-UFS/Ebserh para avaliar a estrutura do hospital. “Como cirurgião, avaliei a estrutura do centro cirúrgico. Posso dizer que as salas estão muito bem equipadas e as pessoas com as quais conversei estão bastante envolvidas com todos os processos relacionados a doadores e receptores. Faremos alguns ajustes finais e, daqui a algumas semanas, o hospital estará preparado para começar”, assegura o cirurgião.
Para os primeiros dois transplantes, o Albert Einstein vai enviar uma equipe especializada, encabeçada por Mario Nogueira, que ficará alguns dias em Aracaju e dará suporte aos profissionais locais no procedimento operatório e no pós-operatório imediato. “O hospital está tendo todo o cuidado e empenho para fazer esse sonho acontecer. Aracaju tem todas as condições de se tornar um polo e, de repente, até trazer também, de outros estados, pessoas que precisam fazer o transplante”, assevera.
Tipos de transplantes
O procedimento de transplante renal intervivos consiste em identificar, no entorno social do paciente, pessoas dispostas a realizar a doação, desde que não haja incompatibilidade. Nesse caso, se o doador é parente do receptor, classifica-se o transplante como de pessoa relacionada (consanguínea). Esse é o primeiro tipo de transplante que o HU-UFS/Ebserh vai começar a realizar, chamado de eletivo.
Por sua vez, o procedimento que envolve um doador cadáver não é eletivo, pois o receptor deve estar inscrito numa lista única estadual e preencher os demais critérios legalmente previstos. Nessa situação, o hospital recebe o paciente enviado pelo sistema de regulação e, havendo compatibilidade, realiza o procedimento. Ademais, o doador deve ter falecido por morte encefálica e a doação precisa de autorização expressa da família. O HU-UFS/Ebserh pretende fazer esse tipo de transplante no futuro, quando já tiver experiência suficiente nos respectivos protocolos ambulatoriais e hospitalares.
Em ambos os casos, os procedimentos são precedidos por uma série de exames. “Primeiramente, faz-se o exame da tipagem sanguínea, que é o básico. Depois, há um exame chamado HLA para o que chamamos de prova cruzada, a fim de determinar se as duas pessoas são compatíveis ou não. Além disso, é preciso ver as condições clínicas do receptor e do doador por meio de exames laboratoriais e de imagem”, explica a enfermeira Michelle Cardoso. No HU-UFS/Ebserh, o candidato ao transplante renal poderá fazer quase todos os exames necessários no próprio hospital-escola. “O HLA e outros exames mais específicos são realizados em parceria com a Central de Transplantes da Secretaria da Saúde de Sergipe”, acrescenta.
Acompanhamento pós-transplante
O urologista Ricardo Bragança garante que o HU-UFS/Ebserh vai acompanhar todos os pacientes de transplante renal. O protocolo de atendimento já está regulamentado para acompanhamento ambulatorial, destinado à observação do pós-operatório e intervenção em eventuais ocorrências, inclusive, se necessário, com disponibilidade de nova internação hospitalar.
“O cronograma do protocolo prevê, como regra, um acompanhamento inicialmente semanal. Depois, com a evolução positiva do quadro clínico, as consultas se tornam mensais. Se tudo continuar correndo bem, o paciente passa a um acompanhamento bimensal ou trimestral”, detalha o médico.
Importância para o ensino e a pesquisa
A experiência e a formação dos profissionais envolvidos vão permitir, também, que o hospital da Ebserh em Aracaju cumpra com a sua responsabilidade acadêmica. “Além de prestar assistência de excelência ao usuário do SUS, temos que deixar ensinamentos aos estudantes. Em particular, os estudantes de graduação terão mais um aprendizado de um dos tratamentos possíveis da insuficiência renal e poderão assistir aos procedimentos. Já os residentes da área cirúrgica vão ter participação direta na composição da equipe, para despertarmos eventual interesse em especialização na área. Por fim, os alunos de pós-graduação poderão, observados todos os preceitos éticos, realizar diversos experimentos de pesquisa. Nesse ponto específico só temos a ganhar, pois os resultados das pesquisas nos dizem como podemos fazer o transplante de uma maneira cada vez melhor”, destaca Ricardo Bragança.
Equipe multiprofissional
Atualmente, a equipe de transplantes renais do HU-UFS/Ebserh está formada por dois nefrologistas; três cirurgiões; um médico intensivista; dois anestesistas; dois enfermeiros; um farmacêutico; um psicólogo; uma assistente social; um nutricionista; um fisioterapeuta; dois médicos infectologistas; e um assistente administrativo. Além desses membros, outros profissionais darão suporte aos transplantes, entre residentes, pessoal da higienização e colaboradores do serviço laboratorial.
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Por Luís Fernando Lourenço