Nesta quinta-feira, 10/12, a partir das 14h, o Tribunal Regional Eleitoral realiza a última sessão para julgamento dos casos de repasse irregular e desvios de recursos das verbas de subvenção da Assembleia Legislativa do Estado (Alese). Entre os casos analisados, está o da ex-deputada, ex-presidente da Alese e atual conselheira do Tribunal de Contas do Estado, Maria Angélica Guimarães.
Neste processo, a Procuradoria Regional Eleitoral em Sergipe (PRE/SE) pediu o reconhecimento gravidade da conduta da ex-deputada, com a consequente inelegibilidade de Angélica por oito anos, além da aplicação da multa máxima prevista, de R$ 106,4 mil.
A ação é resultado das investigações da PRE/SE sobre a irregularidade do repasse das verbas de subvenção, que eram um recurso, no valor de R$ 1,5 milhão por ano, disponível para todos os deputados distribuírem entre entidades de cunho social.
De acordo com as investigações da PRE/SE, que envolveram visitas às associações, oitiva de testemunhas, análise de documentos e quebra de sigilo bancário das entidades envolvidas, a deputado agiu diretamente para destinar verbas a entidades de sua família ou de fachada. Assim, contribuiu para o desvio dos recursos e atividades assistencialistas, já que parte das associações tinham como representantes aliados políticos e familiares da ex-deputada.
O Ministério Público analisou a relação de Angélica Guiimarães com três associações, que juntas receberam R$ 760 mil dos R$ 1,5 milhão que a parlamentar tinha disponível para distribuir.
Itabaiana – O Centro Social de Assistência Serrana recebeu R$ 100 mil em verbas de subvenção da então deputada Angélica Guimarães. A instituição não funciona no endereço em que está registrada e, em seu depoimento, a presidente da entidade, Anna Kelly de Jesus Andrade, indicou mais de um endereço para a entidade e não comprovou o efetivo funcionamento do Centro Social.
O endereço onde a instituição está oficialmente registrada é o mesmo da Construtora Serrano, de propriedade de José Milton Alves dos Santos, primo de Ana Kelly. No mesmo local, funcionou, em 2014, o comitê eleitoral de José Milton, que foi candidado a deputado estadual pelo Partido Social Liberal (PSL) com o nome de Zé Milton de Zé de Dona. Já Ana Kelly foi candidata a deputada federal pelo mesmo partido, com o nome de Kelly de Zé de Dona.
Para a PRE/SE, a coincidência entre os endereços entre o centro social, a construtora e o comitê eleitoral é um sinal de que a instituição é de fachada e só existe “no papel”.
A quebra de sigilo bancário comprovou que a entidade movimenta apenas as verbas de subvenção, não tendo nenhuma outra atividade. A presidente da entidade afirmou que o centro social realiza transporte de pessoas doentes, atendimento odontológico e distribuição de remédios e cestas básicas, mas que não funcionou ao longo de todo anos de 2014 por falta de recursos, apesar do benefício das subvenções.
Acontece que valor R$ 100 mil de subvenções recebidos pelo centro social em 2014 foi todo sacado em 40 dias após o recebimento. Houve pagamentos a fornecedores e também cheques nominais a dirigentes da entidades e pessoas ligadas a eles. Pelo menos 90% dos recursos foi sacado em espécie, dificultando o rastreamento do destino dos recursos.
Moita Bonita – A Associação dos Moradores Carentes de Moita Bonita recebeu R$ 275 mil em subvenções, sendo R$ 80 mil repassados por Angélica Guimarães. A presidente da Associação, Soraya Barreto, é servidora da Assembleia e seu marido, Laelson Edmilson Costa Santos, já foi servidor da Alese, os dois nomeados pela própria Angélica. Laelson já concorreu a diversos cargos eletivos pelo Partido Social Cristão (PSC), o mesmo de Angélica, e, em sua residência, funcionaram comitês eleitorais no último pleito.
Segundo seus depoimentos, a associação funcionava com uma van e um trator. A van servia para transporte de pessoas a Aracaju, Lagarto e Itabaiana, e o trator, para arar terras de pequenos agricultores. Não havia critérios para o uso dos equipamentos da associação e o serviço de transporte de pessoas e aragem de terras continuava mesmo no período eleitoral. Mais de 40% dos recursos da associação (R$ 119 mil) teriam sido gastos com a aquisição de combustíveis.
Japoatã – A Associação Comunitária Nossa Senhora do Desterro está intimamente ligada à deputada por vários laços e recebeu R$ 580 mil em subvenções no ano de 2014.
A principal atividade da entidade é gerir a Unidade de Saúde Mista Dra Angélica Guimarães, ou seja, um centro de saúde que tem o nome da ex-deputada. O marido de Angélica Guimarães, o médico Vanderbal Marinho, realizava atendimentos na unidade e recebia pagamentos da associação. E a presidente da instituição até julho de 2014 era Maria Estela Guimarães Santos, mãe da ex-deputada.
Mesmo quando sua mãe deixou de ser presidente da associação, Angélica não perdeu a ingerência sobre a entidade, pois quando Maria Estela renunciou, o cargo foi assumido por Luiz Evilásio da Silva, servidor do gabinete da deputada, mas que, como ele próprio reconheceu em depoimento à Justiça Eleitoral, não desempenhava qualquer atividade na ALESE.
Em dezembro de 2014, após o início das investigações do MP Eleitoral, a então deputada Angélica Guimarães informou que a entidade havia devolvido os R$ 580 mil à Alese, sob alegação de que a transferência havia sido equivocada, pela entidade ter prestações de contas em aberto com a Assembleia.
No entendimento do MP Eleitoral, “a devolução dos valores, além de não corrigir a destinação indevida de recursos em ano eleitoral, confirma que a representada atuou para a liberação irregular da verba em favor da entidade que administra a unidade de saúde com o seu nome, e demonstra seu poder de comando sob a associação, uma vez que, mesmo não ocupando qualquer cargo na entidade, agiu para que seu responsável formal providenciasse, sem qualquer provocação da Alese, a devolução de mais de meio milhão de reais”.
Para a PRE/SE, a deputada contribuiu diretamente para que o dinheiro público fosse desviado, ao enviar verbas para entidades de fachada. A gravidade dos fatos, no entendimento do Ministério Público, impõem a aplicação de todas as sanções previstas na legislação.
Argumentos – O principal argumento do Ministério Público Eleitoral na ação é de que a Lei Eleitoral proíbe expressamente, no ano de eleições, “a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública”. A exceção é nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, o que não foi o caso das verbas de subvenção da Alese.
De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral, para configurar a conduta vedada não é necessário demonstrar o uso eleitoreiro da distribuição dos bens e valores. Apenas o fato de distribuir os recursos durante o período proibido por lei configura a conduta vedada e gera a perda do mandato para o candidato.
A lei prevê ainda que haja proporcionalidade na aplicação das penas, por isso, de acordo com o MP Eleitoral, a gravidade dos fatos no caso da ex-deputada Angélica Guimarães requer a aplicação de todas as penas previstas, no caso, além da aplicação de multa no valor de R$ 106,4 mil, o máximo permitido pela lei que rege as eleições, o reconhecimento de que a sua conduta é merecedora da cassação de diploma (caso, evidentemente, ele tivesse sido eleito).
Se no julgamento do caso, o TRE/SE reconhecer que a conduta merece cassação, tal reconhecimento tem como consequência, segundo decisões do Tribunal Superior Eleitoral, a inelegibilidade da ex-deputada pelo prazo de oito anos.
Acompanhe o SE Notícias noTwitter e no Facebook
Assessoria de Comunicação
Ministério Público Federal em Sergipe