O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou constitucional o sistema de cotas raciais da Universidade de Brasília (UnB). Todos os ministros votaram contra a ação ajuizada pelo partido Democratas em 2009 contra os atos administrativos do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da UnB (Cepe), que instituíram o acesso de alunos negros por cotas.
O julgamento teve início ontem, mas a sessão foi interrompida por falta de quórum logo que o ministro relator Ricardo Lewandowski proferiu seu voto. Na mesma sessão as partes envolvidas e outros participantes, na condição de amigos da corte, fizeram sustentações orais. Para o DEM, o sistema de cotas da UnB fere o princípio da igualdade entre os candidatos que ingressam no ensino superior.
O primeiro ministro a votar na sessão de hoje foi Luiz Fux, que votou a favor do sistema de cotas raciais da UnB. “A política das cotas atende à saciedade o princípio da proporcionalidade”, disse o ministro. Durante o voto de Fux, a sessão foi suspensa por alguns minutos, pois duas pessoas que assistiam ao julgamento no tribunal se manifestaram, pedindo que os indígenas fossem citados nos votos.
O próximo voto foi da ministra Rosa Weber, também favorável ao sistema de cotas. A ministra pontuou que a igualdade se apresenta de duas maneiras na Constituição Federal, a formal e a material. A primeira determina que todos são iguais perante a lei. Na visão da ministra, porém, essa norma desconsidera processos sociais concretos de formação de desigualdades. “Nesses casos é necessária a intervenção do estado”, disse. Caberia, portanto, a noção de igualdade material, com o intuito de diminuir as desigualdades sociais. Rosa Weber destacou a estatística de que entre os 10% mais pobres da população brasileira, 75% são pretos e pardos. “Quando o negro se tornar visível nas camadas mais altas da sociedade, política compensatória alguma será necessária.”
A ministra Cármen Lúcia concordou com o posicionamento de Rosa Weber. Ela entende que as ações afirmativas não são a melhor opção para diminuir o preconceito racial no país, mas fazem parte de um processo e precisam ser acompanhadas de outras ações e políticas públicas. A ministra elogiou tanto as posições contrárias ao sistema de cotas apresentadas durante o julgamento, como as favoráveis, e lembrou que é responsabilidade social e estatal fazer com que o princípio constitucional da igualdade se cumpra.
Único ministro negro da corte, Joaquim Barbosa, falou por cerca de dez minutos apenas. Barbosa disse que, além de seu ponto de vista sobre o tema ser bem conhecido, o voto do relator “esgotou o assunto e está em sintonia com o que há de mais moderno a respeito das políticas de ações afirmativas”. Cezar Peluso defendeu a igualdade de oportunidades entre brancos e negros: “O que as pessoas são e o que as pessoas fazem depende das oportunidades e das experiências que elas tiveram”.
Gilmar Mendes votou pela improcedência da ação movida pelo DEM, mas disse que o critério puramente racial pode causar distorções e facilitar o acesso à universidade de alunos negros que têm boas condições socioeconômicas. Mesmo assim, o ministro reconheceu que, devido a seu pioneirismo, o modelo da UnB ainda é experimental e deve ser aperfeiçoado para evitar questionamentos posteriores. Marco Aurélio Mello lembrou o príncipio da autonomia universitária na tomada de decisões administrativas. “A correção das desigualdades mostra-se possível, por isso, façamos o que está ao nosso alcance, o que está escrito na Constituição Federal”, afirmou.
Os dois últimos votos da noite foram proferidos pelo ministro Celso de Mello e pelo presidente Carlos Ayres Britto. Mello acrescentou à fala dos outros ministros o fato de que o Brasil firmou compromisso perante a comunidade internacional de eliminar todas as formas de discriminação racial, por isso a importância de adotar políticas afirmativas que ajudem a reduzir desigualdades étnicas. O presidente do STF lembrou todos os que sofrem preconceito na sociedade. Ele disse que negros, mulheres, pobres, deficientes físicos, homossexuais, idosos, analfabetos e índios carregam uma desiguladade potencializada.
O ministro Antonio Dias Toffoli se declarou impedido de votar e não participou do julgamento pois, quando era advogado-geral da União, foi favorável à reserva de vagas.
Mariana Niederauer