Por Valter Lima do Brasil 247
O Brasil pode diminuir, consideravelmente, a sua dependência da importação de fertilizantes, graças à exploração da carnalita para produção do potássio, em Sergipe. No entanto, essa mudança no cenário dos negócios no país tende a ficar somente no campo das possibilidades. Isto em decorrência da birra política de Ezequiel Leite, prefeito de Capela, município onde estão as maiores reservas do minério no Brasil. Ele, filiado ao PSC, se recusa a assinar documento autorizando o uso do solo da cidade pela Vale, pois não admite que a fábrica de fertilizantes seja construída no município vizinho, Japaratuba, administrado por Hélio Sobral, do PMDB. A briga PSC-PMDB é uma réplica da disputa eleitoral que se dará no Estado neste ano, onde o governador Jackson Barreto (PMDB) enfrentará o senador Eduardo Amorim (PSC).
Capela é um município pequeno, de apenas 31 mil habitantes, mas tende a causar um grave problema na economia nacional. A resposta negativa do prefeito de lá impede que a Vale invista R$ 2 bilhões, só na primeira etapa do projeto, podendo chegar a R$ 4 bilhões, em seus empreendimentos em Sergipe. Faz com que o Brasil permaneça produzindo menos de 10% do potássio que necessita e continue importando o restante.
Em nota pública divulgada nesta semana, o prefeito Ezequiel Leite se diz vítima da pressão do Governo do Estado para que assine a liberação do uso do solo e afirma que não há justificativa técnica documental da Vale que explique a opção pela cidade vizinha, Japaratuba, para construção da usina de beneficiamento da carnalita, “sem levar em consideração que 80% de toda a reserva está em subsolo capelense”.
“Diante dessa injustiça com a população de Capela, com a consciência tranquila e ciente de que não poderia tomar nenhuma decisão que retirasse uma riqueza preciosa dos nossos limites, para enriquecer outro município, tomei a decisão de não assinar a concessão por entender que Capela sofreria prejuízos incalculáveis caso aceitasse, como prefeito, que a usina seja implantada em Japaratuba. É incompreensível tal decisão defendida pelo Governo de Sergipe, uma vez que o local onde se pretende construir a usina fica a menos de 10 metros do limite entre Capela e Japaratuba, o que reforça a tese de que nosso município estaria sendo vítima de uma decisão unicamente política, sem nenhum critério técnico”, afirma.
No entanto, Ezequiel Leite faz exatamente o que ele critica na nota: jogo político. A decisão sobre a usina não coube ao governo, mas sim à empresa. A opção pelo terreno em Japaratuba, por exemplo, considera toda a rede de gasoduto que liga o município a outro, Barra dos Coqueiros, por onde a produção seria escoada. Quando houve a delimitação do local onde seria construído o empreendimento não se sabia nem que a área não pertencia a Capela, o que desmonta o discurso político do prefeito de Capela. Da parte da administração estadual o que há, atualmente, é uma tentativa de acordo entre os dois municípios e a Vale para não perder o investimento. O governo já propôs até que os lucros obtidos com o beneficiamento da carnalita sejam divididos entre as duas cidades, como forma de amenizar a briga, mas a ideia foi rechaçada pelo prefeito de Capela, um novato em política, que nunca disputou cargo público.
A grande questão de Capela reside na tributação. A cidade não aceita que o município vizinho, onde será erguida a usina, receba mais impostos. Mas este problema foi causado pela própria Capela. Em outra disputa por royalties, com o município de Rosário do Catete, o prefeito anterior, Manoel Sukita (PSB), recorreu à Justiça Federal para mudar a forma como era feita a tributação no Estado. Sempre foi consenso em Sergipe que a maior parte dos impostos ficava com a cidade de origem da matéria-prima. Mas isto foi alterado após a ação judicial de Capela. Ou seja, a questão não é política. É jurídica. E ainda está em caráter liminar, podendo voltar ao formato anterior, a qualquer momento, o que mais uma vez derruba o argumento falacioso de Ezequiel Leite.
O projeto da Vale, com a permissão dos prefeitos, entraria em sua fase mais decisiva, pois seria levado aos acionistas para aprovação em fevereiro, e, posterior, captação de recursos. Sem a assinatura de Ezequiel, a proposta fica paralisada e deve perder importância dentro da empresa, uma vez que os lucros obtidos com o potássio são pequenos comparados a outros projetos da mineradora. Ao contrário do que afirma o prefeito de Capela em nota, o projeto Carnalita não será “altamente lucrativo” para a Vale e essa briga política sem sentido pode sim fazê-la desistir da exploração.
Ou seja, a decisão de Ezequiel Leite impede, de uma só vez, o desenvolvimento econômico de Capela, de Japaratuba, de Sergipe e do Brasil. É a reafirmação de uma visão provinciana exacerbada, que desconsidera fatores técnicos mais relevantes e não observa o cenário econômico nacional, logicamente mais abrangente. Além disso, a não assinatura da autorização de uso do solo desfaz todo o esforço do ex-governador Marcelo Déda (PT) para tornar o projeto viável.
Foi pelas mãos de Déda que se construiu o acordo entre Vale e Petrobras para tornar o projeto Carnalita possível, uma vez que a área de exploração pertencia a petroleira. Com a insistência do ex-governador (falecido no mês passado) junto ao governo federal foi possível um entendimento entre as duas empresas, que fizeram uma troca de áreas de interesse – a Petrobras cedeu o subsolo em Capela para exploração e recebeu da Vale permissão para atuar em uma região do Paraná. Em 2012, a presidente Dilma Rousseff (PT), inclusive, veio a Sergipe, assinar o acordo.
Reduzir um megaprojeto como este a uma disputa política local diz muito das reais intenções de certos políticos, mais preocupados com as próximas eleições do que com o bem-estar do povo. Carnalita prevê a criação de milhares de empregos e iria gerar, já na primeira fase, mais de 1 milhão de toneladas do cloreto de potássio por ano. Seria um passo relevante para a busca da autossuficiência deste bem no país.