O Ministério Público Federal (MPF) está processando novamente a União e a Fundação Nacional do Índio (Funai), requerendo a aquisição de terras em Sergipe para criação de mais um território indígena no Estado. Desta vez, o processo pretende beneficiar mais de 70 famílias da etnia Fulkaxó que atualmente vivem na terra indígena Kariri-Xocó, em Porto Real do Colégio (AL).
Desde 2006, os Fulkaxó vêm informando à Funai a existência de tensões na convivência entre as duas etnias e a impossibilidade de permanecer habitando a mesma terra indígena. Diante disso, eles solicitaram à Fundação que viabilizasse a compra de uma fazenda que fica a cerca de 60 km da comunidade onde moram atualmente.
No processo, a procuradora da República Lívia Nascimento Tinôco explica que os índios Fulkaxó se sentem discriminados pelos Kariri-Xocós e afirmam terem sido excluídos na distribuição terras da comunidade.
Em 2007, a Funai afirmou que iria adotar as providências cabíveis para a compra das terras pretendidas pelos Fulkaxós. Entretanto, em 2008, a própria Fundação informou que esta aquisição só seria realizada após comprovados “fatos de extraordinária gravidade” que justificassem a retirada dos Fulkaxós da terra indígena Kariri-Xocó. Os Fulkaxós, por sua vez, voltaram a afirmar a impossibilidade da convivência pacífica e necessidade de possuírem seu próprio território, onde possam plantar e realizar seus rituais e cultos.
Laudo – Diante do impasse, o MPF em Sergipe requisitou o auxílio da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF (órgão setorial de coordenação, integração e revisão nos temas relativos aos povos indígenas e outras minorias étnicas) para a realização de um laudo antropológico.
O laudo apontou a existência do conflito entre as etnias e tensões geradas pela escassez de terras, e afirma que o território ocupado pelas duas etnias é insuficiente para garantir uma vida digna a todas as famílias.
De acordo com o documento, as famílias Fulkaxó não se sentem representadas pelas lideranças políticas Kariri-Xocó. Ademais, sentem-se excluídas dos processos decisórios e discriminados na distribuição dos parcos recursos assistenciais que chegam à comunidade.
Ficou demonstrado ainda que, o fato de índios da etnia Kariri-Xocó trabalharem nas unidades da Funai responsáveis por aquela região dificulta o reconhecimento, por parte dos Fulkaxós, da Fundação como parte mediadora dos conflitos.
Para a procuradora Lívia Tinôco, ficou comprovada a existência de um conflito insolúvel entre as etnias. “A aquisição de terras para os indígenas que sofrem discriminação impedirá a desagregação desses índios em busca de melhores condições de vida e é medida que se impõe ao governo federal”, afirma a procuradora Lívia Tinôco.
Fulkaxó – Os Fulkaxó se reconhecem como descendentes das etnias Kariri, Xocó e Fulniô. Todos as famílias dessa etnia fazem parte da comunidade Kariri-Xocó, mantendo-se ainda entre ambas as etnias importantes laços religiosos. A procuradora destaca, no processo, que é sabido que na comunidade Kariri-Xocó sempre conviveram outras linhagens indígenas que se reconheciam como um só povo.
Em relato ao MPF, os Fulkaxó explicam que necessitam desmembrar a comunidade para que possam ter uma vida mais digna, com acesso a terra para plantio, e autonomia para dar continuidade à sua descendência, costumes, tradições e rituais religiosos.
“Ferir o direito ao território é, por consequência, atingir o direito indígena, constitucionalmente garantido, de os índios expressarem sua religiosidade, sua cultura e os seus costumes”, lembra a procuradora Lívia Tinôco.