Redação, Carta Capital
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) acolheu um recurso do Ministério Público Federal e determinou que a 26ª Vara Cível federal, em São Paulo, dê prosseguimento à ação civil pública aberta pelo MPF contra a Editora Abril, que publica a revista Veja, por danos morais coletivos. O MPF processa a publicação por conta de uma reportagem considerada discriminatória contraindígenas e quilombolas e pede indenização mínima de R$ 1 milhão.
O MPF propôs a ação em agosto de 2014, quatro anos após a publicação da reportagem “A farra da antropologia oportunista”, mas o juiz de primeira instância declarou o processo prescrito, com base no prazo de três anos previsto no Código Civil para pedidos de reparação civil.
Para o desembargador federal Carlos Muta, do TRF-3, o período máximo para o ajuizamento de ação civil pública em matérias que envolvem direitos coletivos é de cinco anos, no entanto, conforme a Lei 4.717/65.
De acordo com o MPF, “o texto da revista Veja baseou-se em informações distorcidas e expressões injuriosas” para criticar o processo de demarcação de reservas aos povos tradicionais. A reportagem, diz o MPF, “procurou caracterizar a criação de novas reservas como fruto do conchavo entre ativistas que sobreviveriam dos sucessos das demarcações, agentes públicos e antropólogos cujo trabalho não teria nenhum rigor científico, mas simplesmente viés ideológico de esquerda”.
Segundo a procuradoria, Veja “utiliza vários termos depreciativos que incitam o preconceito contra as comunidades indígenas e outras minorias étnicas”, como a expressão “os novos canibais” para definir os Tupinambás.
Ainda segundo o MPF, a reportagem “distorceu as declarações de dois renomados antropólogos que se dedicam ao estudo das questões indígenas”. São eles professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e ex-presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Márcio Pereira Gomes, e o pesquisador da UFF Eduardo Viveiros de Castro. Após a publicação, lembra o MPF, ambos “escreveram aos editores da revista, indignados com o fato de que as frases a eles atribuídas eram opostas ao que realmente pensam sobre o tema.”
Segundo o MPF, a procuradora da República Suzana Fairbanks Oliveira Schnitzlein, autora da ação contra Veja, avalia que “declarações de cunho racista e que promovem a discriminação contra minorias étnicas não podem ser toleradas a pretexto de liberdade de expressão e de imprensa”. Segundo Schnitzlein, esses direitos fundamentais não se confundem com “o puro e simples discurso de ódio camuflado de reportagem jornalística”.