Ao julgar Recurso de Apelação, a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça Estado de Sergipe decidiu manter sentença condenatória em face do médico Flamarion Luiz Tavares e de Maria José de Araújo Oliveira, funcionária do Hospital São Vicente de Paula (HSVP), localizado no município de Propriá. Em 2003, o Ministério Público os denunciou pelo crime de homicídio culposo – em concurso com outras três condutas delituosas – que vitimou um recém-nascido, após um trabalho de parto negligenciado.
De acordo com o voto do Relator, Desembargador Dr. Luiz Antônio Araújo Mendonça, “todo o acervo probatório leva à certeza de que o médico plantonista não analisou o quadro clínico da adolescente, não efetuou o parto e somente ficou adstrito a permanecer estagnado na porta por alguns instantes”. Na época, a parturiente tinha apenas 15 anos, ou seja, tratava-se de uma gravidez precoce, que requeria cuidados especiais. Além disso, o bebê era prematuro; foi expelido por esforço próprio da mãe, sem nenhum auxílio técnico; e tinha dificuldades respiratórias, o que levou à conclusão de que ele teria nascido morto. Conforme consta dos autos, o corpo foi entregue à família numa caixa de papelão.
A avó da criança, Neilza Ulisses Santos, declarou que, já em sua residência, situada na cidade de Japoatã, foi surpreendida ao ouvir um choro de bebê. Aspirando pelas narinas, ela tentou fazê-lo respirar melhor e, somente no dia seguinte, conseguiu transporte para retornar ao Hospital de Propriá e solicitar as providências devidas. Desta vez, Dr. Famarion havia ausentado-se do plantão para conduzir Maria José (segunda denunciada) até a cidade alagoana de São Brás. Só restou uma alternativa: a maternidade Hildete Falcão, em Aracaju (a 100 KM de distância). Apesar de todos os esforços empreendidos pela equipe médica da capital, o recém-nascido faleceu no dia 06 de maio de 2003.
Para esquivarem-se da responsabilidade, os denunciados promoveram alterações em documentos do HSVP e elaboraram relatório de evolução e prescrição médica. A intenção era demonstrar que, ao contrário do que fora afirmado inicialmente, a criança nasceu com vida e recebeu os cuidados necessários.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em seu artigo 229, enuncia que, se o médico ou enfermeiro deixar de identificar corretamente o neonato e a parturiente, por ocasião do parto, e ainda não realizar os exames referidos no artigo 10 da mesma lei, sofrerá pena de detenção de seis meses a dois anos. Essa conduta também foi verificada no caso. E mais: descobriu-se que Maria José de Araújo Oliveira não estava habilitada a exercer a função de auxiliar de enfermagem.
Na Apelação, os réus postularam a reforma da sentença que os condenou sob várias alegações: uma delas foi a de inexistirem provas suficientes quanto à culpa. Porém, o Acórdão do TJ foi categórico: “a materialidade e a autoria do delito restaram devidamente comprovadas”.
Pelo que prescreve a legislação, o médico deverá cumprir duas penas restitivas de direitos, consistentes na prestação pecuniária de cinco salários mínimos cada uma, a serem depositadas em conta judicial. As condutas por ele praticadas classificam-se como homicídio culposo, falsidade ideológica, e ofensa ao artigo 229 do ECA. Pelos mesmos crimes e ainda por exercício ilegal da profissão de auxiliar de enfermagem, também foi condenada Maria José de Araújo Oliveira.
Hebert Ferreira
Coordenadoria de Comunicação – MP/SE