Desde o início do ano, auditores fiscais flagraram 3.432 crianças e jovens trabalhando em todo o Brasil. O resultado é inferior aos 5.382 casos registrados no mesmo período do ano passado, mas, segundo especialistas, demonstra que o Brasil pode não atingir a meta de erradicar o trabalho infantil até 2020, caso a iniciativa privada e, principalmente, o Poder Público não intensifiquem os esforços nesse sentido.
Assim como no passado, a maioria das crianças flagradas trabalhando este ano tem entre 10 e 15 anos, faixa etária de 1.889 meninos e meninas encontrados exercendo alguma atividade laboral irregular. Setenta e sete tinham entre 5 e 9 anos e uma delas, menos de 5 anos. Os dados são da Secretaria de Inspeção do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Emprego. Nos três grupos, o número de casos registrados é inferior ao dos que ocorreram no mesmo período do ano passado, quando foram flagrados, respectivamente, 2.848; 208 e 12 casos.
O ministério também já encontrou, este ano, 1.465 jovens de 16 e 17 anos nessa situação. No entanto, como a secretaria não discriminou que tipo de atividade os jovens desempenhavam, a reportagem da Agência Brasil não teve como concluir se a situação deles feria a lei, ou não, já que a Constituição Federal permite a contratação a partir dos 16 anos, desde que os contratados não exerçam ou se exponham a atividades insalubres. A contratação é permitida também dos 14 aos 16 anos na condição de menor aprendiz, com acompanhamento e orientação adequada. Se não fossem levados em conta esses casos, o total de crianças encontradas este ano cairia para 1.967.
Do total, 79 jovens trabalhavam no setor agrícola; 381 no comércio; 169 na indústria – aí incluídas atividades como fabricação de farinha de mandioca (12) e de papel (11), abate de aves (8) e confecção de roupas (8) –; 28 na construção; 228 em lanchonetes, bares, hotéis e restaurantes; 11 no setor de transporte; 21 em serviços; três em educação; um em saúde e 17 em vários outros setores. Os auditores flagraram também 171 crianças exercendo alguma atividade em associações de defesa de direitos sociais.
Com 729 casos registrados no último período, Pernambuco manteve o posto de unidade da Federação a registrar o maior número de flagrantes. No ano passado, 902 ocorrências foram identificadas no estado. Depois de Pernambuco, os estados que tiveram maior número de casos foram Goiás, com 385, e Mato Grosso do Sul, com 319.
Nesta semana, a secretária executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, Isa Oliveira, disse à Agência Brasil que, apesar de uma perceptível queda no número de flagrantes, o ritmo com que o número de casos vem diminuindo também caiu nos últimos anos. De acordo com Isa, há estimativas de que algo em torno de 3,4 milhões de crianças ainda trabalhem em todo o país, o que, para ela, ameaça o cumprimento da meta de erradicação até 2020.
Já o coordenador nacional de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e Adolescentes e procurador do Ministério Público do Trabalho, Rafael Dias Marques, disse hoje (12) que o ritmo de redução das formas de trabalho infantil vem perdendo força porque começou-se a enfrentar o que ele classifica de “núcleo duro do problema”, ou seja, o setor informal. “O nível de redução tende a perder força justamente porque identificar a presença de crianças nas atividades informais, inclusive o trabalho doméstico, é muito mais difícil. Isso exige que as políticas públicas sejam aperfeiçoadas. Exige formas de atuação integral e maior integração entre áreas como educação, assistência social e geração de emprego. São políticas públicas cujo resultado só virá em médio e longo prazos. Sem isso, no ritmo atual, dificilmente conseguiremos atingir as metas.”
A organização não governamental (ONG) Plan International divulgou, também quarta-feira (10), o resultado de uma pesquisa segundo a qual quase 14% das meninas brasileiras entre 6 e 14 anos dizem trabalhar ou já ter trabalhado para terceiros. “É um dado assustador, que mostra a total violação dos direitos das crianças”, disse o gerente de Monitoramento, Avaliação e Relatório da ong, Luca Sinesi.
A Agência Brasil tentou ouvir o Ministério do Trabalho sobre os números, comentários e sanções aplicadas aos responsáveis por empregar essas crianças e jovens, mas não obteve respostas.
Fonte: Agência Brasil