A juíza da Comarca de Itabaiana, Maria Diorlanda Castro Nóbrega, acatou a ação civil pública, impetrada pelo Ministério Público de Sergipe, e determinou hoje (18), o bloqueio das contas da prefeitura.
De acordo com o MPE, a medida se fazia necessária em virtude dos constantes atrasos no pagamento dos salários do funcionalismo, situação que vem acontece desde o mês de maio de 2010. “O requerido atrasa injustificadamente o pagamento dos servidores públicos municipais, o que tem por demais causado insegurança e danos aos referidos agentes, além de prejuízos no comércio local”, alega o Ministério Público na ação.
A Promotoria destacou ainda que, apesar das ações judiciais que tramitam no Judiciário de Itabaiana (processos ns. 201252100178 e 201252100240), onde inclusive, executa Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), “através do qual o município se comprometeu a não mais atrasar o pagamento dos servidores, a situação não se modificou, somando-se no ano corrente dois meses de remuneração em atraso, conforme ofícios ns. 181/2012 e 183/2012 da Secretaria da Fazenda do Município de Itabaiana, juntados aos autos.”
Segundo o MPE, o quadro em Itabaiana é agravado em decorrência de “uma série de gastos operados pelo demandado com festas e com um programa similar ao Bolsa Família Federal, que subtraíram vasta quantia dos cofres públicos neste ano, o que induz sua má gestão.”
Em sua sentença, a magistrada determinou o Bloqueio de todas as contas da prefeitura, bem como todos os recursos do município, sobretudo àqueles oriundos do FPM e FUNDEB, para destiná-los ao pagamento dos servidores por ordem do próprio Poder Judiciário.
Maria Diorlanda estabeleceu à prefeitura, que encaminhe em 24 horas, a folha de pagamento dos servidores e dos salários em atrasos. Ficou estabelecido ainda que o Município deve entregar, até o dia 25 de cada mês, a este juízo, a folha de pagamento de todos os agentes públicos.
A sentença estabelece ainda que o município se abstenha de utilizar qualquer recurso bloqueado ou não bloqueado, dentro de cada mês, de saldar qualquer crédito que não tenha natureza alimentícia enquanto não forem quitados os salários de todos os servidores.
Em caso de descumprimento de uma ou das quatro determinações acima, o prefeito e os secretários de Finanças e de Administração poderão pagar multas que variam de R$ 50 mil a R$ 200 mil cada, sem prejuízo do enquadramento no Crime de Desobediência.
Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe
Gerada em
18/10/2012
15:50:34
–
DECISÃO OU DESPACHO
Dados do Processo
Número
201252101331
Classe
Ação Civil Pública
Competência
2ª VARA CIVEL DE ITABAIANA
Situação
ANDAMENTO
Distribuido Em:
17/10/2012
Proc. Origem
201252100240
Dados da Parte
Requerente
MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE SERGIPE
Requerido
MUNICIPIO DE ITABAIANA
Pai: PESSOA JURIDICA DE DIR. PUBLICO
Mae: PESSOA JURIDICA DE DIR. PUBLICO
DECISÃO
Apensem-se.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SERGIPE, por intermédio da Promotora de Justiça Curadora do Patrimônio Público, ajuizou a presente Ação Civil Pública com pedido de liminar em face do MUNICÍPIO DE ITABAIANA, devidamente qualificado nos autos, alegando que desde o mês de maio do ano de 2010, o requerido atrasa injustificadamente o pagamento dos servidores públicos municipais, o que tem por demais causado insegurança e danos aos referidos agentes, além de prejuízos no comércio local.
Aduz ainda que, apesar das ações judiciais que tramitam nesta vara (processos ns. 201252100178 e 201252100240), onde inclusive, executa Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), onde o município se comprometeu a não mais atrasar o pagamento dos servidores, a situação não se modificou, somando-se no ano corrente dois meses de remuneração em atraso, conforme ofícios ns. 181/2012 e 183/2012 da Secretaria da Fazenda do Município de Itabaiana, juntados aos autos.
Afirma ainda que, tal quadro é agravado pelo fato de que, uma série de gastos operados pelo demandado com festas e com um programa similar ao Bolsa Família Federal, subtraíram vasta quantia dos cofres públicos neste ano, o que induz sua má gestão.
Pugna assim, pela concessão de antecipação dos efeitos da tutela, sem a oitiva prévia do município em razão da urgência, para que seja determinado: a) o imediato bloqueio de todos os recursos repassados ao Município de Itabaiana e destinados ao custeio de pessoal, em especial do FPM e do FUNDEB, os quais serão destinados pelo próprio Poder Judiciário ao pagamento dos servidores em atraso; b) que seja o município obrigado a encaminhar, em 24 (vinte e quatro) horas, a folha de pagamento dos servidores e dos salários em atraso, sob pena de multa direta e solidária ao Prefeito Municipal, Secretários de Finanças e Secretário de Administração no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais); c) que seja determinado que no concernente aos salários que se vencerem no curso desta ação, o Município entregue a folha de pagamento de todos os servidores públicos, até o dia 25 (vinte e cinco) de cada mês, a este Juízo, sob pena de multa direta, pessoal e solidária ao Prefeito Municipal, Secretário de Finanças e Secretário de Administração no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais); d) que o Município de Itabaiana se abstenha de utilizar qualquer recurso bloqueado ou não bloqueado, dentro de cada mês, para saldar qualquer crédito que não tenha natureza alimentar, enquanto não forem quitados os salários de todos os servidores, sob pena de multa de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) a ser paga pelo Prefeito, Secretário de Finanças e o Secretário de Administração.
Juntou documentos de fls. 12/49,dos quais destaco o Procedimento Preparatório instaurado pelo Ministério Público e os documentos de fls. 54/83, referente a declarações de servidores municipais efetivos quanto ao atraso no pagamento dos salários.
Vieram-me os autos conclusos.
Decido.
De logo, cabe avaliar a possibilidade de concessão da tutela inaudita altera pars, em que pese a previsão do art. 2º da Lei n. 8.437/92.
Ora, tramita neste Juízo, a Execução de Título Extrajudicial n. 201252100178 e a Ação de Improbidade Administrativa n. 201252100240, visando o cumprimento da obrigação de pagar os salários em dia, pelo município, sendo, portanto do conhecimento do demandado o objeto do presente processo.
Além disso, verifico que o interesse em tela requer uma tutela emergencial, ante a natureza alimentar da prestação inadimplida, o lapso temporal de atraso no pagamento que em alguns casos chegou a atingir 76 dias, conforme fls. 75/77, e principalmente o fato de que nas últimas eleições municipais ocorridas em 07 de outubro deste ano, o atual gestor não foi reeleito.
Dito isto, passo a análise do pleito antecipatório propriamente dito.
A concessão de antecipação de tutela pressupõe a presença dos requisitos previstos no art. 273 do Código de Processo Civil, a saber: prova inequívoca que convença o julgador da verossimilhança da alegação e fundado receio de dano irreparável e de difícil reparação ouque fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. Além disso, tem-se o requisito de caráter negativo previsto no § 2º do mesmo dispositivo, qual seja, a reversibilidade da decisão.
No caso dos autos, verifico que as alegações do requerente são verossímeis o que é corroborado pelo procedimento preparatório juntado aos autos e pelo fato de que é de notório conhecimento nesta comarca acerca dos atrasos no pagamento dos servidores municipais, e ainda foram também juntadas declarações escritas de próprio punho pelos servidores municipais com salário atrasado.
Quanto ao receio de dano irreparável ou de difícil reparação, em análise preliminar, sem adentrar no mérito do feito, necessário tecer algumas considerações acerca da natureza alimentar do direito sob análise e do princípio da reserva do possível.
A Constituição Federal, em seu art. 100, estabelece:
À exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos (…)”.
“Parágrafo 1º-A. Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários (…)”.
Depreende-se do supracitado dispositivo constitucional que é dispensado todo um sistema de proteção ao salário, uma vez que além de ser considerado crédito de natureza alimentar, tem sua cobrança processada de maneira diferenciada em relação aos demais débitos do Poder Público, consoante se vê, pela exceção ao sistema dos precatórios.
Ressalte-se que o salário constitui direito social, conforme art. 7º, VII da Constituição Federal.
Destaco ainda que a garantia de recebimento em dia dos vencimentos pelos servidores, mesmo que inexistente os dispositivos acima citados, é alvo de proteção pela atual ordem constitucional, frente ao princípio fundamental da República Federativa do Brasil constante do art. 1º, III, da CF, qual seja, a dignidade da pessoa humana.
Ora, se os servidores públicos municipais deixam de auferir seus vencimentos, sua qualidade de vida, bem como de sua família é diretamente afetada uma vez que além da falta de manutenção do lar, gera insofismável angústia àqueles que encontram-se nesta situação, haja vista que a referida verba salarial, constitui seu meio de sobrevivência, motivo pelo qual, seu não recebimento afeta o mínimo existencial do indivíduo.
É bom lembar também, que em um município em que gera boa parte de suas riquezas são provenientes da atividade comercial, o atraso no pagameto dos salários dos servidores, ocasiona danos que atingem a referida atividade ocasionando sua retração, com graves consequencias para o crescimento econômico do próprio ente federativo.
Antes que um poder discricionário da Administração, o pagamento dos vencimentos dos servidores públicos, constitui dever do administrador, cuja atuação deve ser norteada pelos princípios da legalidade, moralidade, eficiência e impessoalidade, notadamente em casos como o ora analisado, em que restou constatado que não houve atraso no pagamento de alguns servidores, sem qualquer parâmetro que justifique tal situação discriminatória.
O ordenamento jurídico não deixa qualquer margem para análise dos critérios de conveniência e oportunidade no pagamento dos salários dos servidores, haja vista que tal atuação adminstrativa constitui um fim e não o meio para atingir o interesse público, uma vez que servidores insatisfeitos prestam serviço público de má qualidade.
Eis as elucidadoras palavras de Gilmar Ferreira Mendes:
“(…) todos sabemos que a fome não pode esperar -, quando mais não seja por força do princípio da dignidade da pessoa humana, que, sendo o valor-fonte dos demais valores, está acima de quaisquer outros, acaso positivados nos textos constitucionais. Inserem-se nessa frente de combate aqueles que, afinados com idéias semelhantes às de Andréas Krell e tantos outros, acoimam de “falaciosa” a reserva do possível, deplorando a indiferença dos que, de costas voltadas para o que é essencial, não se dão conta de que “se os recursos não são suficientes, deve-se retirá-los de outras áreaas (transporte, fomento, serviço de dívida), onde sua aplicação não está tão intimamente ligada aos direitos mais essenciais do homem: sua vida, integridade física e saúde.” (MENDES, Gilmar Ferreira, MENDES, Inocêncio Mártires Coelho, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional, p.713-714.)
Isto posto, despicienda maiores divagações dada a relevância do direito, DEFIRO a antecipação dos efeitos da tutela, nos termos do art. 273 do Código de Processo Civil, para determinar:
a) O Bloqueio de todas as contas do Município, bem como todos os recursos do Município, sobretudo àqueles oriundos do FPM e FUNDEB, para destiná-los ao pagamento dos servidores por ordem do próprio Poder Judiciário;
b) Que o Município encaminhe em 24 horas, a folha de pagamento dos servidores e do salários em atrasos, sob pena de multa direta e solidária ao Prefeito Municipal, Secretário de Finanças e Secretário de Administração no valor de R$ 50.000,00(cinquenta mil reais), sem prejuízo do enquadramento no Crime de Desobediência;
c) Que o Município entregue, até o dia 25(vinte e cinco) de cada mês, a este juízo, a folha de pagamento de todos os agentes públicos, sob pena de multa direta e solidária ao Prefeito Municipal, Secretário de Finanças e Secretário de Administração no valor de R$ 50.000,00(cinquenta mil reais), sem prejuízo do enquadramento no Crime de Desobediência;
d) Que o Município se abstenha de utilizar qualquer recurso bloqueado ou não bloqueado, dentro de cada mês, de saldar qualquer crédito que não tenha natureza alimentícia enquanto não forem quitados os salários de todos os servidores, sob pena de multa de R$ 50.000,00(cinquenta mil reais), também contra o Prefeito Municipal, o Secretário de Finanças e Secretário de Administração solidariamente;
e) Oficie-se com Urgência todas as Instituições Bancárias com sede neste Município, dando ciência da decisão e determinando o bloqueio e impedindo qualquer movimentação financeira tais como pagamento, saque, compensação, transferência etc. por parte dos gestores municipais.
f) Oficie-se às Agências centrais do Banco do Brasil, Banco do Estado de Sergipe, Banco do Nordeste e Caixa Econômica Federal, para que tomem ciência e cumpram ou façam cumprir esta ordem, devendo ainda encaminhar a este juízo a relação de contas, respectivas agências e saldos das contas mantidas pelo Município réu.
Visando confrontar posteriormente as informações trazidas pelo réu e pelas Instituições Financeiras determino a utilização do sistema BACENJUD, para bloqueio de todo saldo existente nas contas do Município e apresentação de relação de constas e ativos.
Cite-se e intime-se o Município Réu, com urgência.
Intimem-se o Prefeito Municipal, o Secretário de Finanças e Secretário de Administração, pessoalmente.
Itabaiana/SE, 18 de outubro de 2012
Maria Diorlanda Castro Nóbrega
Juíza de Direito
Agência Empauta Comunicação