A Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira pedindo a anulação do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff que tramita no Congresso Nacional. Segundo o advogado-geral, José Eduardo Cardozo, houve irregularidade na condução do processo na Câmara, por ter sido guiado pelo presidente afastado da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Cardozo argumenta que, na semana passada, o STF afastou Cunha do cargo devido à conduta imprópria do parlamentar.
“A condução, por Eduardo Cunha, do procedimento na Câmara dos Deputados destinado ao exame da admissibilidade da denúncia em desfavor da senhora presidenta da República, restou eivado de vícios decorrentes de desvio de finalidade, refletindo na nulidade absoluta do vergastado processo”, escreveu Cardozo.
Segundo o advogado-geral, deve ser considerado nulo o ato de recebimento parcial da denúncia, os atos decorrentes do recebimento e a decisão tomada pelo plenário da Câmara, “em decorrência de manifesto desvio de poder”.
Ainda segundo a AGU, “desde antes da deflagração do processo de impeachment, o Presidente da Câmara agiu em marcante desvio de finalidade, buscando influir no procedimento de modo a atingir interesses pessoais espúrios”. Na ação, Cardozo também argumenta que a decisão de condenar a presidente é muito séria e não pode ser tomada de forma supostamente irregular. “A magnitude do impacto político-econômico-social que um processo de impeachment contra a senhora presidenta da República acarreta é enorme. O país precisará de meses, senão anos, para recompor-se, independentemente do desfecho do processo”.
Ontem, o presidente interino da Câmara, deputado Waldir Maranhão (PP-MA), anulou a votação ocorrida no plenário da Casa, por ter identificado irregularidade no processo de condução do caso. Em seguida, voltou atrás e revogou o próprio ato. Está marcada para amanhã a votação do processo no plenário do Senado. Se for admitida a denúncia, a presidente será afastada do cargo por até 180 dias. A ação de Cardozo é a última cartada do governo para tentar impedir essa decisão, já que a maioria dos senadores estaria inclinada a aceitar a denúncia contra Dilma.
No julgamento da semana passada, o STF não anulou os atos de Cunha por conta dos “desvios de finalidade” que ele teria cometido no cargo. Não foi mencionada pelos ministros qualquer irregularidade no andamento do processo de impeachment contra Dilma na Câmara, apesar de a condução ter sido realizada por Cunha. Agora, Cardozo quer que o STF declare que o afastamento de Cunha do cargo impacta no andamento do processo de impeachment.
“Urge, pois, que esse Supremo Tribunal Federal reconheça a prática contumaz de atos com desvio de finalidade, pelo então Presidente da Câmara dos Deputados, também em outras esferas, como é o caso do processo de admissibilidade da denúncia por crime de responsabilidade contra a Presidenta da República. Caso tais atos não sejam prontamente anulados como é devido, poderão acarretar consequências seríssimas que conduzirão ao impeachment de uma presidenta da República democraticamente eleita”, escreveu o advogado-geral.
A estratégia foi discutida durante toda a manhã pela equipe de defesa da presidente, chefiada por Cardozo. Ainda de madrugada, a equipe de defesa passou a discutir possíveis novas medidas para, se não derrubar, ao menos retardar a votação do Senado. A avaliação é de que, uma vez que os senadores votem a matéria em plenário, culminando com o afastamento de Dilma por até 180 dias, as chances de reverter a cassação ficam praticamente inviáveis.
O governo contava com o presidente do Senado, Renan Calheiros, para atrasar um pouco o cronograma estabelecido na Câmara após Waldir Maranhão decidiu anular a votação do impeachment na Câmara. No entanto, Renan ignorou o ato do presidente interino da Câmara e manteve o rito estabelecido, que prevê a votação para esta quarta-feira. Com isso, resta ao governo judicializar o processo. Alguns parlamentares governistas aventam a possibilidade de recorrer até a Corte Interamericana de Direitos Humanos, da qual o Brasil faz parte.
Pela manhã, o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), o uruguaio Luis Almagro, esteve com Dilma no Planalto e disse que consultará a Corte Interamericana de Direitos Humanos para verificar se há “cerceamento” democrático no Brasil
— Não tivemos respostas jurídicas contundentes — disse Almagro, que completou: — Nós temos que fazer uma consulta jurídica à Corte Interamericana de Direitos Humanos quanto à proteção de direitos nesse caso, se houve cerceamento à função da democracia.
POR CAROLINA BRÍGIDO E RENATA MARIZ/O GLOBO
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