Eduardo Militão , Rosana Hessel, Correio Braziliense
Um movimento de deputados contentes com a aprovação da continuidade do processo de impeachment de Dilma Rousseff estuda fazer uma espécie de anistia em agradecimento ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que permitiu o início do andamento da denúncia por crime de responsabilidade.
De acordo com o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), “essa grande maioria” dos votos à cassação da petista seria favorável a ignorar as denúncias de corrupção, lavagem de dinheiro e falsa declaração aos colegas de Congresso. Ele diz que há um entendimento de que Cunha foi fundamental para o avanço do processo.
O presidente da Câmara responde a inquéritos no Supremo Tribunal Federal e já é réu sob acusação de receber US$ 5 milhões de propina de lobista de estaleiro que obteve um contrato de US$ 1,2 bilhão com a Petrobras. Alvo de um processo no Conselho de Ética, Cunha pode ter o mandato cassado pelo plenário, situação em que perderia o foro privilegiado e estaria sob risco de ser preso pelo juiz da Lava-Jato no Paraná, Sérgio Moro, assim como já aconteceu com três ex-parlamentares.
Serraglio disse que a hipótese é discutida nos corredores da Câmara. Não seria uma anistia formal, mas apenas uma espécie de “esquecimento do caso”. “Acho que daqui a um mês, dois meses, ninguém vai querer saber de mais nada”, avaliou.
Adversário de Cunha, o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) disse que soube da mesma informação por meio de mensagens de celular que acabaram vazando na internet. Para Alessandro Molon (Rede-RJ), o peemedebista seria “premiado” com a blindagem por conseguir aprovar a cassação de Dilma. Integrante da tropa de choque do peemedebista, Paulinho da Força (PDT-SP) diz que, sem a ação do presidente da Câmara, “não teria o impeachment”. Para ele, muitos deputados passarão a ver “com maior simpatia” a ideia de não punir Cunha. Ele ainda não tem uma conta de quantos colegas apoiariam essa atitude. “Não dá para fazer essa conta ainda”, afirmou.
Serraglio disse que não sabe se apoiaria essa iniciativa. “Não vou amaciar, mas eu sou muito pragmático. Tem que fazer uma avaliação de expectativa de resultados.”
O deputado Milton Monti (PR-SP) não acredita que Cunha será poupado. Segundo ele, a mesma pressão social do voto aberto para aprovar o impeachment de Dilma vai recair sobre a Câmara caso os parlamentares resolvam não punir o presidente da Casa. De acordo com Monti, qualquer presidente, menos um do PT, abriria o processo de impeachment porque a economia e a articulação política da petista estavam muito desgastadas. “Isso não melhora a situação do Cunha”, conclui.
Um alto integrante do governo federal e interlocutor de movimentos sociais entende que é possível pressionar o Congresso com a ajuda até de defensores do impeachment de Dilma. Ele destaca que, nos movimentos anti-PT, existem os que são contra Cunha e até mesmo contra o PSDB.
Vitorioso
Para o cientista político David Fleischer, professor emérito da Universidade de Brasília (UnB), o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), pode ser considerado o vitorioso dessa votação. “Ele seria o grande vencedor, mas por pouco tempo. Tudo indica que ele deve cair. Provavelmente ele vai renunciar à presidência da Câmara para tentar salvar o mandato”, afirmou. No entanto, Fleischer reconhece que, como um grande conhecedor do regimento da Casa, soube desempenhar o papel com muita habilidade. “Ele atuou bem o modelo e está no ápice do cargo”, completou.
O presidente do PPS, deputado Roberto Freire (SP), diz que “dois terços da Casa votando contra Dilma não é vingança de Cunha”. Segundo ele, Cunha não terá condições de continuar na escala sucessória. “O deputado não poderia assumir a presidência porque ele tem que renunciar. Ele já é réu. Aí o presidente do Senado assumiria e, se ele não tiver condição, assumiria o presidente do STF”, destacou. “Assim que o vice-presidente Temer for o novo presidente, Cunha não será mais presidente da Câmara. Isso está garantido”, pontuou.