O presidente Jair Bolsonaro assinou nesta terça-feira (15), em cerimônia no Palácio do Planalto, um decreto que facilita a posse de armas de fogo.
O direito à posse é a autorização para manter uma arma de fogo em casa ou no local de trabalho (desde que o dono da arma seja o responsável legal pelo estabelecimento). Para andar com a arma na rua, é preciso ter direito ao porte, cujas regras são mais rigorosas e não foram tratadas no decreto.
O texto do decreto permite aos cidadãos residentes em área urbana ou rural manter arma de fogo em casa, desde que cumpridos os requisitos de “efetiva necessidade”, a serem examinados pela Polícia Federal (veja regras mais abaixo).
Cumpridos os requisitos, o cidadão poderá ter até quatro armas, limite que pode ser ultrapassado em casos específicos.
O decreto também prevê que o prazo de validade do registro da arma, hoje de cinco anos, passará para dez anos.
“Todo e qualquer cidadão e cidadã, em qualquer lugar do país, por conta desse dispositivo, tem o direito de ir até uma delegacia de Polícia Federal, levar os seus documentos, pedir autorização, adquirir a arma e poder ter a respectiva posse“, declarou o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
A Polícia Federal decidirá se autoriza ou não a concessão da posse. Não terá direito à posse:
quem tiver vínculo comprovado com organizações criminosas;
mentir na declaração de efetiva necessidade;
agir como ‘pessoa interposta’ de alguém que não preenche os requisitos para ter posse.
Além disso, o decreto mantém a proibição de posse de armas de uso exclusivo das Forças Armadas e instituições de segurança pública.
O que prevê o decreto
Pelas novas regras, ficam estabelecidos os seguintes critérios para que o cidadão comprove “efetiva necessidade” de possuir arma em casa:
Ser agente público (ativo ou inativo) de categorias como: agentes de segurança, funcionário da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), agentes penintenciários, funcionários do sistema socioeducativo e trabalhadores de polícia administrativa;
Ser militar (ativo ou inativo)
Residir em área rural;
Residir em área urbana de estados com índices anuais de mais de dez homicídios por cem mil habitantes, segundo dados de 2016 apresentados no Atlas da Violência 2018 (todos os estados e o Distrito Federal se encaixam nesse critério).
Ser dono ou responsável legal de estabelecimentos comerciais ou industriais;
Ser colecionador, atirador e caçador, devidamente registrados no Comando do Exército.
Além disso, as pessoas que quiserem ter arma em casa precisarão obedecer a seguinte exigência:
Comprovar existência de cofre ou local seguro para armazenamento, em casas nas quais morem crianças, adolescentes ou pessoa com deficiência mental;
Exigências
O novo decreto mantém inalteradas exigências que já vigoravam sobre posse de armas, como:
Obrigatoriedade de cursos para manejar a arma;
Ter ao menos 25 anos;
Ter ocupação lícita;
Não estar respondendo a inquérito policial ou processo criminal;
Não ter antecedentes criminais nas justiças Federal, Estadual (incluindo juizados), Militar e Eleitoral;
Bolsonaro
O texto assinado por Bolsonaro modifica um decreto de 2004, que regulamenta o Estatuto do Desarmamento. O Estatuto dispõe sobre regras para posse e porte de arma no país.
“Como o povo soberanamente decidiu por ocasião do referendo de 2005, para lhes garantir esse legítimo direito à defesa, eu, como presidente, vou usar esta arma”, disse Bolsonaro, mostrando uma caneta antes de assinar o decreto.
No discurso, o presidente afirmou que o decreto restabelece um direito definido no referendo.
“Infelizmente o governo, à época, buscou maneiras em decretos e portarias para negar esse direito”, disse Bolsonaro. “O povo decidiu por comprar armas e munições e nós não podemos negar o que o povo quis nesse momento”, declarou.
Segundo pesquisa do Instituto Datafolha divulgada em 31 de dezembro, 61% dos entrevistados consideram que a posse de armas de fogo deve ser proibida por representar ameaça à vida de outras pessoas.
No discurso na solenidade de assinatura do decreto, Bolsonaro criticou a maneira como a lei até então em vigor exigia comprovação da “efetiva necessidade” de ter uma arma em casa. Segundo ele, essa regra “beirava a subjetividade”.
O novo texto mantém a exigência da efetiva necessidade, mas estabelece as situações concretas em que se verificam a “efetiva necessidade”.
Além disso, a Polícia Federal, ao analisar a solicitação, vai presumir que os dados fornecidos pelo cidadão para comprovar a “efetiva necessidade” são verdadeiros.
Com isso, segundo o ministro Onyx Lorenzoni, a “verdade” estará com o cidadão quando ele fizer o pedido. “Basta uma declaração do cidadão e esta declaração será tomada como verdade”, afirmou.
Na cerimônia, Bolsonaro afirmou que, mediante convênios, a PF poderá fazer parceria com polícias locais para analisar os pedidos de posse de armas.
Válido em todo o país
Em entrevista à GloboNews após a assinatura do decreto, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, disse que o governo usou como base para estabelecer critérios do decreto os dados sobre homicídios relativos a 2016, a fim de não deixar nenhum estado de fora da abrangência das novas regras.
“É para valer para o país inteiro. Quando nós estávamos fazendo o estudo, isso de alguma forma vazou. E havia uma preocupação de que algum estado brasileiro – São Paulo principalmente, Santa Catarina é outro estado – pudessem estar abaixo desse critério. Então, nós tomamos as medidas de fazer o congelamento nos dados de 2016, expressos no Atlas de 2018, exatamente para que nenhum cidadão, conforme foi o desejo expresso pela sociedade brasileira em 2005, querendo exercer o direito, exercer”, disse o ministro.
Histórico
O decreto foi a principal medida adotada por Bolsonaro desde a posse como presidente da República. Até então, o governo havia anunciado revisões em contratos, liberações de recursos e exonerações e nomeações de funcionários.
Considerado uma promessa de campanha do presidente, o decreto estava em discussão desde os primeiros dias do governo. O texto passou pelo Ministério da Justiça, comandado por Sérgio Moro.
Ao jornal “O Globo”, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, afirmou que a Constituição não impede mudanças nas regras da posse de armas.
Em dezembro, antes de assumir a Presidência, Bolsonaro escreveu em uma rede social que pretendia garantir por meio de decreto a posse de armas de fogo a cidadãos sem antecedentes criminais.
O presidente é crítico do Estatuto do Desarmamento, que, segundo ele, impõe regras muito rígidas para a posse de arma. Durante sua carreira política, Bolsonaro defendeu reformular a legislação a fim de facilitar o uso de armas pelos cidadãos.
Íntegra do decreto
Leia abaixo a íntegra do decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro.
ECRETO Nº , DE DE DE 2019
Altera o Decreto nº 5.123, de 1º de julho de 2004, que regulamenta a Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas – SINARM e define crimes.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003,
DECRETA:
Art. 1º O Decreto nº 5.123, de 1º de julho de 2004, passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 12. …………………………………………………………………………………………
………………………………………………………………………………………………………
VIII – na hipótese de residência habitada também por criança, adolescente ou pessoa com deficiência mental, apresentar declaração de que a sua residência possui cofre ou local seguro com tranca para armazenamento.
§ 1º Presume-se a veracidade dos fatos e das circunstâncias afirmadas na declaração de efetiva necessidade a que se refere o inciso I do caput, a qual será examinada pela Polícia Federal nos termos deste artigo.
………………………………………………………………………………………………………
§ 7º Para a aquisição de armas de fogo de uso permitido, considera-se presente a efetiva necessidade nas seguintes hipóteses:
I – agentes públicos, inclusive os inativos:
a) da área de segurança pública;
b) integrantes das carreiras da Agência Brasileira de Inteligência;
c) da administração penitenciária;
d) do sistema socioeducativo, desde que lotados nas unidades de internação a que se refere o inciso VI do caput do art. 112 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990; e
e) envolvidos no exercício de atividades de poder de polícia administrativa ou de correição em caráter permanente;
II – militares ativos e inativos;
III – residentes em área rural;
IV – residentes em áreas urbanas com elevados índices de violência, assim consideradas aquelas localizadas em unidades federativas com índices anuais de mais de dez homicídios por cem mil habitantes, no ano de 2016, conforme os dados do Atlas da Violência 2018, produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública;
V – titulares ou responsáveis legais de estabelecimentos comerciais ou industriais; e
VI – colecionadores, atiradores e caçadores, devidamente registrados no Comando do Exército.
§ 8º O disposto no § 7º se aplica para a aquisição de até quatro armas de fogo de uso permitido e não exclui a caracterização da efetiva necessidade se presentes outros fatos e circunstâncias que a justifiquem, inclusive para a aquisição de armas de fogo de uso permitido em quantidade superior a esse limite, conforme legislação vigente.
§ 9º Constituem razões para o indeferimento do pedido ou para o cancelamento do registro:
I – a ausência dos requisitos a que se referem os incisos I a VII do caput; e
II – quando houver comprovação de que o requerente:
a) prestou a declaração de efetiva necessidade com afirmações falsas;
b) mantém vínculo com grupos criminosos; e
c) age como pessoa interposta de quem não preenche os requisitos a que se referem os incisos I a VII do caput.
§ 10. A inobservância do disposto no inciso VIII do caput sujeitará o interessado à pena prevista no art. 13 da Lei nº 10.826, de 2003.” (NR)
“Art. 15. …………………………………………………………………………………………
Parágrafo único. Os dados de que tratam o inciso I e a alínea “b” do inciso II do caput serão substituídos pelo número de matrícula funcional, na hipótese em que o cadastro no SIGMA ou no SINARM estiver relacionado com armas de fogo pertencentes a integrantes da Agência Brasileira de Inteligência.” (NR)
“Art. 16. …………………………………………………………………………………………
………………………………………………………………………………………………………
§ 2º Os requisitos de que tratam os incisos IV, V, VI e VII do caput do art. 12 deverão ser comprovados, periodicamente, a cada dez anos, junto à Polícia Federal, para fins de renovação do Certificado de Registro.
……………………………………………………………………………………………..” (NR)
“Art. 18. …………………………………………………………………………………………
………………………………………………………………………………………………………
§ 3º Os requisitos de que tratam os incisos IV, V, VI e VII do caput do art. 12 deverão ser comprovados, periodicamente, a cada dez anos, junto ao Comando do Exército, para fins de renovação do Certificado de Registro.
………………………………………………………………………………………………………
§ 5º Os dados de que tratam o inciso I e a alínea “b” do inciso II do § 2º serão substituídos pelo número de matrícula funcional, na hipótese em que o cadastro no SIGMA ou no SINARM estiver relacionado com armas de fogo pertencentes a integrantes da Agência Brasileira de Inteligência.” (NR)
“Art. 30. …………………………………………………………………………………………
………………………………………………………………………………………………………..
§ 4o As entidades de tiro desportivo e as empresas de instrução de tiro poderão fornecer a seus associados e clientes, desde que obtida autorização específica e obedecidas as condições e requisitos estabelecidos em ato do Comando do Exército, munição recarregada para uso exclusivo nas dependências da instituição em provas, cursos e treinamento.” (NR)
“Art. 67-C. Quaisquer cadastros constantes do SIGMA ou do SINARM, na hipótese em que estiverem relacionados com integrantes da Agência Brasileira de Inteligência, deverão possuir exclusivamente o número de matrícula funcional como dado de qualificação pessoal, incluídos os relativos à aquisição e à venda de armamento e à comunicação de extravio, furto ou roubo de arma de fogo ou seus documentos.” (NR)
Art. 2º Os Certificados de Registro de Arma de Fogo expedidos antes da data de publicação deste Decreto ficam automaticamente renovados pelo prazo a que se refere o § 2º do art. 16 do Decreto nº 5.123, de 2004.
Art. 3º Para fins do disposto no inciso V do caput do art. 6º da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, consideram-se agentes operacionais da Agência Brasileira de Inteligência os servidores e os empregados públicos vinculados àquela Agência.
Art. 4º Fica revogado o § 2º-A do art. 16 do Decreto nº 5.123, de 2004.
Art. 5º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 16 de 2019; 198º da Independência e 131º da República.
Acompanhe o SE Notícias no Twitter, Facebook e no Instagram
Por Guilherme Mazui e Luiz Felipe Barbiéri, G1 — Brasília