Mulheres vítimas de lesões corporais, crimes contra a honra, injúria, ameaças e outros delitos previstos em lei têm, em Sergipe, suporte do Departamento de Atendimento a Grupos Vulneráveis (DAGV), através da Delegacia Especializada de Proteção à Mulher, que acolhe as vítimas, registra ocorrências, encaminha o caso para a justiça, quando necessário, e realiza a proteção delas em abrigos. A divisão da Secretaria de Segurança Pública é ponto de apoio e investigação de casos e, segundo a delegada Renata Aboim, é acionada com mais frequência nos últimos anos por conta da vigência da Lei Maria da Penha que, em vigor há 10 anos, objetiva coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Em Sergipe, os municípios de Aracaju, Estância, Itabaiana e Lagarto têm Delegacias da Mulher. Na capital, o complexo do Santa Maria e bairros da zona Norte são as regiões identificadas pela Secretaria de Segurança Pública (SSP) como de maior incidência de crimes. No que tange aos registros ligados aos crimes contra as mulheres, Aracaju aponta aumento nos números de Boletins de Ocorrência (BO), inquéritos policiais e medidas protetivas. Porém, de acordo com a delegada Renata, os altos dados demonstram que as mulheres se sentem mais seguras para realizar denúncias e buscar auxílio, ao contrário do que ocorria há 10 anos. Outro detalhe é que, apesar de maiores, os números de BOs em 2016, se comparados aos anos entre 2010 e 2014 são menores. Já os casos de medidas protetivas diminuíram significativamente. Em 2012, foram 812, atingindo pico em 2013, com 1.013 registros. Já em 2016 foram 695, menor índice cadastrado no banco de dados da SSP.
“Não podemos dizer que hoje em dia há mais casos, e sim podemos afirmar que houve aumento de denúncias e da procura da delegacia. Antigamente as pessoas tinham receio de buscá-la. Atualmente, até por conta da Lei Maria da Penha, as mulheres procuram com mais frequência e tranquilidade, porque, a partir de 2006, com o advento dessa legislação, temos um instituto importantíssimo que é a medida protetiva, que vai determinar que o agressor se afaste do lar, caso ainda conviva com a mulher, que não se aproxime dela, caso não viva com a vítima, não retorne para o lar e se mantenha distante da vítima de qualquer maneira. Antigamente, não tínhamos nenhuma espécie de proteção. Agora, caso o agressor descumpra a medida, pode vir a ser preso. Essa ameaça faz com que ele realmente se mantenha afastado e é algo que realmente funciona. Para se ter uma ideia, até hoje, desde que a Lei Maria da Penha foi implementada aqui em Aracaju, que é onde existe a maior parte de denúncias no estado, só houve um descumprimento de medida protetiva em que a vítima foi assassinada. O ideal é que ninguém tivesse morrido, mas foi apenas um caso”, explicou Aboim.
Os dados de ocorrências criminais registrados pelas Delegacias Especializadas da Mulher de Sergipe, segundo a Coordenadoria de Estatística e Análise Criminal (CEACrim), demonstram que, somados os números dos meses de janeiro e fevereiro e comparados entre os anos de 2016 e 2017, houve diminuição. O destaque fica para a divisão situada em Estância, que no ano passado registrou 147 crimes e em 2017 pontuou apenas 46 casos. Em Aracaju, os números saltaram de 557 para 414. A delegada da capital sergipana, Renata Aboim, aponta que a maioria dos casos que chegam ao DAGV são crimes contra a honra, de injúria, calúnia, difamação, ameaças e os contra a integridade física, a exemplo de vias de fato e lesão corporal. “Felizmente, aqui em Aracaju os maiores índices não são de lesões corporais graves, gravíssimas e de tentativa de homicídio. Esses casos existem, mas a maioria se trata de lesão corporal leve ou ameaças, sempre acompanhados de xingamentos, que se constituem como injúrias”, esclareceu.
A mulher que se sente lesada em Sergipe pode buscar o apoio de uma das Delegacias da Mulher. De acordo com Renata Aboim, o local está à disposição para orientar com relação aos direitos e tomada de providências necessárias para cada situação. “Muitas vezes a vítima vai conversar com uma amiga ou um parente, que não oferece uma orientação necessária. De modo que o melhor é vir à delegacia, pois temos todo o preparo e estamos aqui para isso. Aqui é o local adequado e imparcial em que a mulher vai ser acolhida e receber a orientação correta”.
O procedimento inicial para a mulher que se sentir lesada é registrar um Boletim de Ocorrência da Delegacia Especializada. Caso ela tenha alguma dúvida com relação ao procedimento ou sobre qualquer assunto, ela pode pedir para conversar com uma das delegadas. Renata Aboim relata que, nos casos em que não há lesão corporal e a mulher tem interesse, pode ser marcada uma audiência de medicação de conflitos, no qual o suspeito é chamado e a audiência serve para esclarecer a questão sem judicializar o fato. Isso geralmente ocorre em crimes de ameaça, injúria e difamação. Nos casos em que há agressão física, a delegacia questiona a vítima se é necessária a solicitação de medida protetiva. Se a resposta for positiva, é aberto um inquérito policial e, depois de concluído o procedimento, o caso é encaminhado para a justiça. Ainda com relação à incidência de lesão corporal, a mulher é encaminhada para o Instituto Médico Legal (IML) fazer exame de corpo delito ou vai a um médico particular, caso deseje, e traz um atestado, que também tem validade.
Em parceria com o trabalho realizado pela Delegacia Especializada, a Maternidade Nossa Senhora de Lourdes (MNSL), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e um abrigo de mulheres realizam trabalhos de apoio. A unidade de saúde é acionada caso haja crime sexual, como, por exemplo, um estupro. A vítima é encaminhada para a MNSL para que sejam adotadas precauções para o caso de uma gravidez indesejada e/ou de uma Infecção Sexualmente Transmissível (IST). No caso do Creas, são direcionadas para este espaço as mulheres que necessitarem de acompanhamento psicológico. Já as vítimas que correm risco de morte são levadas para um abrigo em local sigiloso, até que haja emissão de medida protetiva.
Além da vítima, o agressor também pode receber tratamento, segundo explica a delegada Renata Aboim. Ela conta que essa questão é tratada no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, na 11ª Vara Criminal, e que o acompanhamento psicológico do suspeito é necessário para que haja reflexão. “É importante que o agressor seja conscientizado de que a forma dele agir não está correta e que ele precisa mudar seu ponto de vista. Caso isso não ocorra, ele vai continuar agindo de forma machista e agressiva se não com a vítima, mas com outras mulheres que vier a se relacionar”, pontuou.
Com relação às denúncias realizadas pelas vítimas, a delegada explica que essas são conscientizadas para que não voltem atrás da decisão, mas que, caso elas desistam do procedimento do registro da ocorrência, o procedimento segue e é, posteriormente encaminhado para a justiça. “Procuramos incentivar as vítimas a não perder o fôlego, manter sua vontade de processar, levar o caso para justiça e ver no que dá. Elas podem manifestar o interesse de voltar atrás, mas, de qualquer forma, concluímos o procedimento e encaminhamos para a justiça. Não arquivamos aqui na delegacia. Mesmo que elas não queiram e desistam. E se for um caso de uma lesão corporal, o acusado vai ser indiciado, mesmo que a vítima não deseje. Se for comprovado e se a autoridade policial entender que o fato realmente ocorreu e estiver convencida de que o crime aconteceu, ele vai ser indiciado mesmo contra a vontade da vítima”.
Denúncias e registros
A Delegacia da Mulher funciona de segunda à sexta, em horário comercial, e não fecha para almoço. Em finais de semana, feriados e durante à noite, a pessoa que desejar registrar alguma ocorrência ou procurar ajuda deve se dirigir à Plantonista da região, que toma as providências iniciais e faz o flagrante, se for necessário. Em seguida, o caso é encaminhado para a Delegacia da Mulher.
Com relação aos telefones de contato, é possível buscar ajuda ou realizar denúncias ligando para o 180 – Central de Atendimento à Mulher, 181 – Disque Denúncia da Polícia Civil e 190 – Centro Integrado de Operações de Segurança Pública (Ciosp).
Renata Aboim aconselha que se a pessoa for realizar uma denúncia e o agressor ainda estiver no local da ocorrência, o ideal é ligar direto para o 190, pois uma viatura será deslocada e, se o acusado for encontrado, será encaminhado para a delegacia por conta da prisão em flagrante. Caso o agressor não esteja no local do crime e a vítima não puder ir à delegacia no momento, o ideal, segundo a delegada, é ligar para o 180 e realizar uma denúncia. Ela recomenda que o quanto antes a mulher se dirigir à delegacia, é melhor, pois ela receberá uma guia para realização de exame no IML e receberá orientação para tomada de providências. “Se não adotarmos de imediato algumas ações, pode prejudicar depois o andamento das investigações”, destacou.
Plano Nacional de Segurança Pública
A redução no número de feminicídios e violência contra a mulher estão previstos no Plano Nacional de Segurança Pública, que foi lançado em Aracaju no dia 03 de fevereiro deste ano. De acordo com a diretora do DAGV, a delegada Mariana Diniz, com a Força Nacional, a esperança é que seja implementado em Sergipe o patrulhamento da Lei Maria da Penha, importante para efetivar mais a fiscalização das medidas protetivas e oferecer mais garantia à mulher para que ela se sinta amparada pela Lei Maria da Penha. A ideia é que a atuação aconteça mais nos bairros com maior índice de violência, sendo, em Aracaju, o Santa Maria e os da zona Norte.
O representante do Ministério da Justiça e da Segurança Pública em Sergipe, coronel Edgard Santos de Jesus, comenta que já existem experiências, denominadas ‘Ronda Maria da Penha’, em outros estados com relação à proteção a mulher. Ele conta que a iniciativa é atrelada a Delegacia de Proteção à Mulher e que é feito um cronograma de visitas no qual a instituição policial vai periodicamente fazer rondas nas residências de mulheres constantes de violência, fazendo acompanhamento das vítimas até que haja uma situação definitivamente sem problemas.
Assistência
O Governo de Sergipe, através da Secretaria de Estado da Mulher, Inclusão e Assistência Social, do Trabalho e dos Direitos Humanos (Seidh), desenvolve políticas públicas e ações voltadas para a conscientização e atendimento às mulheres, com atenção especial às vítimas de violência. As Unidades Móveis de Atendimento à Mulher do Campo e da Floresta – Ônibus Lilás percorrem os municípios sergipanos, promovendo palestras, assistência psicológica e jurídica às mulheres, levando aos mais distantes povoados do território sergipano informações e incentivo ao empoderamento.
“Entre 2015 e 2017, o trabalho alcançou mais de 3.500 pessoas, sendo 2.800 mulheres, em todo o estado de Sergipe e, como consequência, deu a Sergipe, no segundo semestre de 2015, a terceira colocação do Brasil no número de denúncias ao disque 180, revelando que a cultura do medo está sendo quebrada e o véu do silêncio, devidamente rompido”, conta a coordenadora da Coordenadoria Estadual de Políticas para Mulheres (CEPM), Edivaneide Paes.
Organismos de Políticas para Mulheres
A CEPM também atua na coordenação dos Organismos de Políticas para Mulheres (OPMs – secretarias ou coordenadorias) nos municípios sergipanos. Hoje, há 30 OPMs no território sergipano e a meta é finalizar 2017 com OPMs implantados nos 75 municípios. Com isso, pretende-se fomentar tanto a implantação de mais Conselhos Municipais de Direitos da Mulher quanto de Centros de Referência de Atendimento à Mulher (CREAMs), que são espaços de acolhimento/atendimento psicológico e social, orientação e encaminhamento jurídico em situação de violência, que devem proporcionar o atendimento e o acolhimento necessários à superação de situação de violência, contribuindo para o fortalecimento da mulher e o resgate de sua cidadania nos municípios. Há CREAMs instalados na Barra dos Coqueiros, Carmópolis, Estância, Itabaiana, Poço Redondo, Propriá e Tobias Barreto.
* Por Monique Garcez, repórter da ASN
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