Na conversão à Agricultura Orgânica, muito daquilo que o agrotóxico fazia antes agora vai ser substituído pela mão de obra mais incisiva nos cultivos. Esse aumento da permanência na plantação, inicialmente, pode parecer que prejudique e diminua o tempo que o produtor tem para ir vender o que colhe. Mas por outro lado, possibilita novas formas de fornecer o alimento para aquele cliente fiel ao consumo de agroecológicos. A área da plantação, antes restrita ao agricultor, implementos e insumos, agora virou local de visitação daqueles que só acreditam vendo e, porque não, de quem quer ter o prazer de arrancar a própria comida da terra, pagar só pelo trabalho de quem plantou e cuidou, para preparar o almoço de logo mais.
Isso já está acontecendo na área coletiva utilizada pelos integrantes da Associação dos Produtores Orgânicos de Sergipe (Bio5), instalados no Perímetro Irrigado Califórnia, em Canindé de São Francisco. Eles investiram em um espaço cedido pela Companhia de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Irrigação de Sergipe (Cohidro), administradora do polo irrigado, onde esses agricultores são acompanhados pelos técnicos da Empresa e aprendem como trabalhar a terra sem usar agroquímicos na prática, utilizando métodos alternativos de controle de pragas, doenças e adubação natural. O excedente do que produzem no treinamento e não é levado para casa, eles mesmos vendem no local.
Elisângela Santos Barros, uma ou duas vezes por semana tem ido até a horta comprar. “Estou fazendo isso já há uns quatro meses. É um produto fresquinho, sem agrotóxico, sem veneno. É bom demais. Só compro aqui mesmo, depois que eles começaram”. A dona de casa tem uma família grande e se preocupa com a qualidade do alimento que põe na mesa, tanto que a mudança de hábito de compra tem chamado a atenção. “O pessoal nota e diz: seu coentro não apodrece, eu digo: é dos meninos ali da Cohidro”, disse ela quando veio à horta da Bio5 levar 15 molhos de coentro, 10 pés de alface, mais pimenta-de-cheiro e cebolinha, cinco molhos de cada.
Edmilson Cordeiro, gerente do Perímetro Califórnia conta que inicialmente eram os servidores da Cohidro, os interessados em comprar os produtos da horta da Bio5. “Agora é frequente o acesso de outras pessoas, de crianças, de famílias que vêm ter a experiência de comprar direto no pé, colher ou escolher o alimento que vai adquirir. Quando o espaço foi cedido à Bio5, sabíamos que era para também uma exploração comercial, já que são 2,2 hectares de terra irrigada. Talvez a característica única do Projeto Califórnia, de ser próximo da cidade e a poucos metros do centro, tenha facilitado a ideia desses produtores”, avaliou ele.
O que os produtores como Gercino Teles de Andrade aprendem na área coletiva, eles querem aplicar em suas próprias hortas, com a intenção de em breve serem registrados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e fazer parte da Organização de Controle Social (OCS) que funciona paralelo e é composta por membros da Bio5. “Queremos tão logo fazer parte da OCS. A partir do documento de inscrição que nos é dado, podemos vender direto ao cliente, produtos com o nome de orgânicos. Por agora, só podemos vender aquilo que estamos mostrando fazer aqui no lote comunitário, onde a gente, nossas famílias trabalham e andam sem se preocupar com nenhum risco de ficar exposto a veneno, porque não usamos nada disso”, garantiu.
Presidente da Cohidro, José Carlos Felizola Filho, observa que a iniciativa desses produtores supera ao menos três dificuldades enfrentadas por todo agricultor orgânico. “Primeiro é a questão de encontrar espaço nas feiras para comercializar esses alimentos, já que a concorrência com os produzidos de forma convencional dificulta muito a venda, porque são quase sempre mais baratos. O outro problema está em ir para as feiras, muitas vezes em outras cidades, gastando muito do tempo em que poderiam cuidar das plantações. Mas o melhor desta ideia está em mostrar para o cliente como é feita a produção, de forma que o convencimento, do não-uso de agrotóxicos, fica bem mais fácil do que com o produto já colhido e exposto em uma banca de feira”, analisa.
Na horta coletiva dos produtores da Bio5, o consumidor pode acompanhar e até participar do processo de plantio. Antônio Dantas Costa Junior ficou sabendo do espaço pelo amigo, que trabalha na Cohidro. “Quando eu morava no interior, eu tive a curiosidade de fazer um canteiro de coentro e hoje eu estou tendo aquela mesma sensação, de trinta anos atrás, de você sentir realmente o que é uma cultura orgânica, a natureza próxima a você, que isso aqui vai trazer saúde para a sua família, considerou. Para ele, existe um apelo comercial muito grande, de produzir em larga escala, sem estar preocupado com o benefício à saúde humana, né? Quando você consegue ter um equilíbrio tudo fica legal, tudo fica saudável, tanto para a natureza como para o ser humano”.
Quem toma conta destes iniciantes na produção orgânica é o Técnico em Agropecuária Tito Reis, da Cohidro. Ele explica que no local repassa as técnicas de plantio das hortaliças, mas também fabrica com os produtores os insumos. “Desenvolvemos um biofertilizante a base de esterco bovino, tronco de bananeira e a nova torta de mamona artesanal. Plantamos aqui também a pimenta ‘dorset naga’, a mais ardida que existe. Com o extrato dela e de uma planta chamada melão de São Caetano, além do sabão de coco derretido, controlamos as pragas. Tratamento que fizemos de pulverização e vacinação. A berinjela, por exemplo, saiu limpa assim, sem manchas no fruto e nas folhas”, informou.
Na horta ainda são cultivados quatro tipos de alface, rúcula, couve, pimentão, quiabo, coentro, cebolinha, salsa, repolho, pimenta-de-cheiro e a pimenta malagueta. “Medindo o pH, os níveis de fertilidade e os índices de condutividade elétrica do solo e da água, fica fácil identificar prováveis situações de falta de nutrientes e aí vamos lá e corrigimos. O resultado pode ser visto aqui, tipo os pés de alface, grandes e limpos, sem pragas e doenças”, reforçou o servidor responsável por acompanhar todos os agricultores orgânicos do Perímetro. Ele acredita que o potencial da horta coletiva ainda pode ser maior. “Com o tempo, esse espaço poderá ser até uma atração turística, sendo Poço Redondo, Canindé e Piranhas-AL, polos de turismo ecológico”, antevê Tito Reis.
Visitação
João Quintiliano da Fonseca Neto, diretor de Irrigação e Desenvolvimento Agrário da Cohidro, considera que a área que a Empresa cedeu aos agricultores contribui também nas atividades da Companhia. “No Califórnia é frequente a visitação de estudantes do ensino regular, de cursos técnicos em agropecuária e até universitários da área agrícola. Um espaço plantado e bem cuidado, anexo à nossa sede local, ajuda muito. Depois de uma apresentação ou palestra no escritório o local de visitação está ao lado, sem que seja preciso deslocar um veículo e técnico para o campo”, concluiu ele, lembrando da recente ida, ao Perímetro, da turma de alunos agrotécnicos do Centro Estadual de Educação Profissional Dom José Brandão de Castro, de Poço Redondo, quando fizeram aula prática na horta.
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Matéria extraída do Portal Agência Sergipe de Noticias.