Uma bactéria que produz toxinas que podem provocar doenças e até matar os seres humanos foi encontrada nas águas sergipanas do “Velho Chico”. O relatório apresentado pelo doutor em Biotecnologia na área de Recursos Naturais Clóvis Franco, que estudou algas na América do Norte e é professor há 40 anos da Universidade Federal de Sergipe (UFS), identificou uma densidade de Cyanobactérias da espécie Cylindrospermopsis raciborskii acima dos parâmetros máximos estabelecidos na resolução 357 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Novas análises estão sendo feitas pelo próprio pesquisador e pela equipe da Adema.
A presença da Cylindrospermopsis raciborskii é resultado da produção das “cachoeiras” de esgoto sem tratamento que podem ser vistas ao longo do trajeto entre Xingó e Paulo Afonso. “Sim, esses esgotos estão sendo lançados nas águas do Rio São Francisco”, reforça Clóvis Franco, que foi solicitado pela Adema para estudar a mancha escura que apareceu no rio, mas acabou encontrando mais do que procurava, a Cylindrospermopsis raciborskii. Ou seja, quem vai se banhar no “Velho Chico” está correndo sérios riscos de saúde.
Preocupado com a evolução dessa bactéria nas águas de um dos mais importantes cursos d’água do Brasil e da América do Sul, o estudioso no assunto é categórico ao afirmar que a bactéria é perigosa e resistente até à água fervente. A depender da concentração de cianobactérias os peixes existentes nas águas do Velho Chico também podem se tornar perigosos para o consumo humano, isso sem falar na água. Vale lembrar que o Rio São Francisco é responsável por 70% do abastecimento de água Aracaju.
Só há um jeito de matar a bactéria. Essa maneira é acabando com a produção de esgoto sem tratamento nas águas do Velho Chico. Ainda segundo o doutor no assunto, o governador de Sergipe já tem conhecimento da presença da Cylindrospermopsis raciborskii, suas consequências e como solucionar o problema. Segundo a Companhia de Saneamento de Sergipe (Deso), a produção de esgoto vista pela equipe do pesquisador da UFS não é de responsabilidade da Companhia. Segundo Clóvis Franco, considerando-se as cianobactérias, o grande problema está relacionado com a produção de toxinas, as quais podem prejudicar mananciais de abastecimento de água potável.
“Tivemos uma reunião com o governador e os senhores da Adema, Deso, Cohidro, Codevasf e todos os órgãos envolvidos. Todos eles sabem também que a solução seria acabar com os esgotos. Uma reunião com os governos de Sergipe, Bahia e Alagoas foi sugerida por mim para tratar desse assunto, já que esgotos do Rio São Francisco são de responsabilidade desses três Estados e estão localizados em Paulo Afonso, Canindé e Delmiro Gouveia. O governador, inclusive, aprovou a sugestão, mas até agora nada. Quero ressaltar a boa vontade da Adema, que tem sido cooperativa, providenciando transporte e a bolsa no valor de R$ 400 para cada um dos dois estagiários (Fábio Andrade dos Santos e Maira Pedral dos Santos) para esse trabalho. Eu não ganho nada com isso. Tem uma equipe da Adema comigo e com eles nesse trabalho que agora está na fase de acompanhamento. O problema é que tem evoluído e a situação é considerada gravíssima, uma tragédia anunciada”, alerta Clóvis Franco, que estudou algas na América do Norte e professor há 40 da UFS.
Ele reitera que em toda a região que serviu de amostra – de Paulo Afonso a Xingó – foi registrada a ocorrência de cianobactérias tóxicas, cujas densidades estão acima dos parâmetros máximos estabelecidos na resolução 357 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). “Atividades como a pesca e o turismo podem ser muito prejudicadas se os problemas relatados não receberem a devida atenção por parte dos governos dos três Estados envolvidos (Sergipe, Bahia e Alagoas). Em Sergipe, como sempre, os órgãos ambientais e também a Deso tentam minimizar suas responsabilidades. É bom lembrar do desabamento da ponte de Pedra Branca, o que causou um transtorno sem precedentes no abastecimento d’água para o Estado!”, ressaltou o pesquisador.
Adema
A bióloga da Adema Evanildes Menezes de Souza reconhece a presença da espécie Cylindrospermopsis raciborskii e o risco que ela representa. Segundo ela, a densidade encontrada de Cyanobactérias da espécie Cylindrospermopsis raciborskii encontrada foi de 31 mil células por mililitro, sendo que a densidade permitida é de 50 mil células por mililitro. “Se os níveis aumentarem há risco de saúde e de crise no abastecimento de água, mas está dentro do nível. Estamos monitorando o tempo todo. Estamos coletando de Xingó até a Hidrelétrica de Paulo Afonso, são mais de 44 Km de extensão em linha reta. Quando chegamos perto de Paulo Afonso percebemos uma cor verde, aí o doutor Clóvis disse ser Cyanobactérias da espécie Cylindrospermopsis raciborskii, que produz toxinas que provocam doenças e pode matar. O problema é que as cidades ribeirinhas não têm tratamento de esgoto, jogam tudo no rio”, disse a bióloga.
Uma nova análise será feita nesta segunda-feira, dia 26. A equipe sairá da Adema às 7 horas com destino ao Rio São Francisco com a missão de mais uma coleta. A cada 45 dias a equipe da Adema e o professor da UFS saem rumo ao Velho Chico. Ainda de acordo com Evanildes, a Adema está aguardando o resultado da análise toxicológica do laboratório da UFS, que deverá ficar pronto daqui a 15 dias. Com o resultado da análise será feito um laudo com todos os resultados e encaminhado ao governador. “O governador está esperando esse laudo para chamar os três Estados – Bahia, Alagoas e Sergipe – e todos os órgãos envolvidos para chamar à responsabilidade. Pode ter certeza que os culpados serão responsabilizados e as providências serão tomadas. Se não demos o alerta e não interditamos, é porque ainda não foi necessário”, garante a bióloga da Adema.
Fonte: Andréa Vaz / Da Equipe JC