por Valter Lima, do Brasil 247
A troca de críticas, acusações e desafios entre os políticos provoca, de certa forma, o debate, gera notícia para a imprensa e cria alguma satisfação em aliados; no entanto, não repercute, no menor modo que seja, na vida dos cidadãos; é a pura demarcação de espaço político e de defesa de projetos; é legítimo, mas não resolve os problemas da falta de médicos, das filas nos postos, da superlotação dos hospitais, da insatisfação dos profissionais da área; e não deixa de ser hipocrisia desses mesmos políticos só enxergar qualidades em sistemas marcados por muitos defeitos.
A recente adoção do modelo de gestão de organizações sociais (OSs) pela Saúde de Aracaju gerou um paralelo de comparação às fundações estatais de direito privado, implantadas na administração estadual há alguns anos. Por isto, se tornaram freqüentes no último mês alguns embates entre o prefeito João Alves Filho (DEM) e o deputado federal Rogério Carvalho (PT).
Rogério é contra as OSs. Enxerga nelas mais defeitos do que qualidades. Diz que o modelo representa a privatização da saúde. “As OSs não são submetidas à licitação e a concurso público, portanto pode ser uma forma de burlar o regramento que dá segurança institucional e transparência a operação pública. É dinheiro público sendo transferido para organizações privadas”, afirmou recentemente em entrevista ao Jornal do Dia e reafirmou suas posições na última sexta-feira (7), no programa de rádio “A Hora da Verdade”, da Megga FM.
Ao expor suas posições, o deputado do PT, que já foi secretário da Saúde de Aracaju e do Estado (nas administrações de Marcelo Déda), tornou-se alvo de adversários políticos. Do próprio prefeito, do deputado estadual Augusto Bezerra (DEM), de vereadores e, mais recentemente, do deputado federal Mendonça Prado (DEM). Para todos eles, os problemas existentes hoje na saúde de Aracaju foram causados por Rogério. Eles também criticam vorazmente as fundações.
“As fundações enganaram muita gente aqui (na Assembleia). Sei quem lava roupa de todo o hospital João Alves. Nunca vi alguém quebrar uma perna e operar 15 dias depois. Colocam uma tala (no paciente) e deixam no corredor. As fundações faliram e o dinheiro ficou para poucos”, afirmou Bezerra, que desafiou Rogério a um debate sobre os dois modelos de gerenciamento da saúde. Já o prefeito acusou Rogério de impedir que recursos federais sejam direcionados para a Saúde de Aracaju. “Ele privatizou (a Saúde) em outro sentido que não quero dizer. Este senhor é o grande responsável pela tragédia da saúde estadual”, disse.
João Alves Filho fez ainda um desafio a Rogério: “quero que ele diga por que quando João Alves saiu, em 2006, o Hospital João Alves era referência no Nordeste todo em eficiência. E depois das fundações está destruído? Na minha época não havia gente nos corredores. Gente passando 19 dias com a perna quebrada. Tudo isso são as fundações. Então, não tenho dúvida que este senhor prejudica o Estado”.
Em resposta ao que foi dito pelo demista, Rogério disse negou que esteja dificultando o acesso da prefeitura de Aracaju a recursos do Ministério da Saúde, se colocou à disposição de João Alves para intermediar uma audiência com o ministro da pasta, Alexandre Padilha, de quem é amigo e desafiou o prefeito a um debate sobre os modelos de gerenciamento e sobre como cada um administrou a Saúde (tanto a da capital quanto a do Estado).
Diante do desafio feito pelo petista quem surgiu para responder foi Mendonça Prado, que, através do Twitter, disse que Rogério tem “perfil excelente para defender as teses da demolição e não da edificação da saúde pública”. “Foi um gestor desastroso. Como Rogério Carvalho é deputado federal também, eu me proponho a fazer o debate com ele. Vou mostrar que ele foi o causador do maior rombo. Coloco-me ao inteiro dispor da imprensa para fazer o debate com o destruidor da saúde pública, Rogério Carvalho. O coveiro mor da saúde”, disse.
A troca de críticas, acusações e desafios entre os políticos provoca, de certa forma, o debate, gera notícia para a imprensa e cria alguma satisfação em aliados. No entanto, não repercute, no menor modo que seja, na vida dos cidadãos. É a pura demarcação de espaço político e de defesa de projetos. É legítimo, mas não resolve os problemas da falta de médicos, das filas nos postos, da superlotação dos hospitais, da insatisfação dos profissionais da área.
E não deixa de ser hipocrisia desses mesmos políticos só enxergar qualidades em sistemas marcados por muitos defeitos. Ou alguém em sã consciência ou dispondo do mínimo lastro de memória desconsiderará os problemas na Saúde Estadual quando João foi governador? De mesmo modo, dá para afirmar que as situações mais graves foram superadas por Rogério Carvalho, quando ele foi secretário da Saúde? Ou ainda se estão resolvidas, atualmente?
No entanto, foi este mesmo Rogério quem operou melhorias significativas na saúde de Aracaju, quando gestor da pasta, entre 2001 e 2006. Sim, o setor era bem avaliado e contou positivamente para a eleição de Marcelo Déda governador. No entanto, como secretário estadual, o petista não gerou a mesma satisfação, embora tenha dotado o Estado de um sistema mais organizado, com clínicas e hospitais regionais que, infelizmente, não funcionam plenamente. Além disso, as fundações enfrentam problemas financeiros.
João é também dono de projetos bem-sucedidos na área. Construiu o maior hospital público do Estado, que leva seu nome, bem como maternidades e outros hospitais. Como prefeito, foi eleito para, principalmente, resolver pendências do setor. Ele vê nas OSs a solução. Através delas, administrará as duas unidades de pronto atendimento da capital e uma maternidade que pretende construir. Mas e os postos? Neles, os problemas também são recorrentes. Diz que continuará gerindo estas unidades pelo modelo já existente. Em seis meses, o demista prometeu uma nova saúde. O tempo passou e a promessa permanece na retórica.
Com fundações ou OSs, dificilmente, tudo se tornará um sonho. A saúde, infelizmente, ainda é palanque da política eleitoral. Os recursos teimam em não ser suficientes. Os governos preferem não atender aos pleitos dos profissionais da área. Os interesses das categorias de trabalhadores, geralmente, se sobrepõem ao bem coletivo. Enfim, falta aos gestores a capacidade gerencial para lidar com o problema com a disposição que ele realmente requer. O sistema padece e clama reforma. A troca de farpas e os discursos inflamados não ajudarão.