* Leila Lessa
Parafraseando o filósofo Jean Jacques Rousseau, eu digo que: o SUS é bom, a gestão é que o corrompe. O SUS, criado em 1988 e aprovado pela Constituição Federal como sendo a solução para a problemática da atenção à saúde universal, está sendo agredido. Os serviços de saúde oferecidos pelo sistema estão, de forma acelerada, tendendo ao caos.
A saúde é direito de todos e dever do Estado, como prega a Constituição Federal. Sem saúde não há disposição, não há trabalho, não há produção. Sem saúde, o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de um país entra em declínio e seu ‘status’ cai na escala mundial. É conhecido que a cada dia o exorbitante número de pessoas doentes dá início à falta de controle sobre os atendimentos hospitalar e ambulatorial, sobre a distribuição de medicamentos, reduzindo a qualidade do serviço, que entra em falência.
Vamos, agora, falar sobre o marco na saúde pública brasileira, que foi a criação do grande SUS: o sistema que clama por resgate.
Considero o SUS um dos maiores orgulhos do povo brasileiro. Pelo menos é como deveria ser tratado. O SUS foi criado para satisfazer a população, para atender a sociedade em todas as etapas, desde a preventiva até a reabilitação, quando o processo de doença já tem se instalado. O sistema foi instaurado com o objetivo de ser o apoio do povo que necessita de atendimento público em saúde com qualidade, ou seja, com eficiência. Sem filas, com respeito e cuidado. O SUS é de todos e para todos. E assim, com princípios norteadores, o SUS foi criado e vem, de forma desorganizada, sendo “oferecido” ao povo.
Vamos, agora, desenvolver o que foi dito no segundo parágrafo. Quando falo em crescente número de pacientes, não ignoro o fato da instalação da doença. E sim, quero relevar a importância de se prevenir. Prevenir custa pouco e não engorda a indústria farmacêutica. Prevenir, como diz o ditado antigo, porém muito sábio: é melhor que remediar. A sociedade quer ênfase nas campanhas que educam, que ensinam a cuidar da saúde como algo precioso que, se perdido, pode demorar a ser recuperado. É necessário mobilizar a população, investir com vontade, ir às ruas e ensinar o povo a se cuidar. Enquanto isto não é feito, a dengue mata, a AIDS torna-se avassaladora e tantas outras se instalam e encharcam os setores de saúde.
Apesar de considerar a atenção primária à saúde o principal meio para se chegar ao SUS projetado, não há como fugir repentinamente da realidade: quando se fala em saúde pública brasileira, várias imagens surgem em nossa mente, como a do telejornal noticiando as quilométricas filas nas UBS´s (Unidades Básicas de Saúde), o desgaste das famílias que lutam e sofrem com a falta de leito nas enfermarias, a da indústria farmacêutica que inova em pesquisas e formulação de novos medicamentos contra doenças letais, lembramos também dos corredores dos hospitais repletos de pacientes que agonizam sem atendimento, geralmente no chão, sem dignidade. Além disso, a longa espera dos pacientes que aguardam a autorização de exames complementares para fins diagnósticos é uma das maiores reclamações existentes. As imagens são angustiantes e, muitas vezes chocam, mas traduzem o atual cenário da saúde pública no Brasil. E assim o SUS vai se transformando no mais temido dos sistemas. Para o paciente, é humilhante pagar pelo sistema (que de público nada tem) e sofrer a humilhação de um atendimento desqualificado, sem humanização. E por citar a palavra, digo que é humanamente impossível tratar o paciente com dignidade quando não se tem o mínimo recurso material para isto, por maior intenção que se tenha em agir com ética e respeito ao que procura auxílio.
Quando se fala em reabilitação física, convivemos com os transtornos sociais que envolvem as pessoas que, por qualquer motivo, tiveram sua locomoção ou qualquer tipo de movimento limitado. No âmbito trabalhista, nota-se o transtorno do empregador que tem seus funcionários afastados do trabalho, pois não suportam realizar sua atividade sem os típicos “picos de dor” que as lesões por esforço repetitivo provocam. As histórias formam praticamente um ciclo que só tende a aumentar. As longas filas parecem não ter fim e a angústia do povo na espera por atendimento também. Voltamos, então, ao ciclo. Então lembramos da prevenção, citada no início do texto.
Convém lembrar que do SUS nasceram políticas de saúde, como a Política Nacional de Saúde da Pessoa Portadora de Deficiência e a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas. Mas, é impressionante como até hoje ainda se foge da acessibilidade e o acesso do povo indígena aos serviços de saúde ainda é extremamente precário. E o que falar da aprovação do ‘Pacto Pela Vida’? O que falar da proposta de humanizar? Infelizmente o que se vê é o avesso, em todos os setores: morte programada nas UTI´S, onde a humanização se desfaz e o ‘tanto faz’ é levado ao paciente terminal. O pacto, agora, é de morte.
E a culpa? A culpa sempre acaba sobre o SUS. Mas, por que o SUS? A população deve entender que o sistema, no papel, é brilhante. O projeto SUS é humano, atende a todos de forma igualitária, em tempo hábil, prevenindo a morte e promovendo cada vez mais a vida. O problema, na minha visão, se concentra nas falhas orçamentárias, na difusão de pessoas sem responsabilidade ou experiência suficiente para lidar com o assunto. Aos gestores, cabe o dever de se inclinar sobre a saúde com mais força e entender que a saúde ainda move as pessoas. É preciso entender que o processo de doença, seja ela qual for, degrada de forma espantosa a imagem de uma sociedade.
É lamentável, mas a saúde, de uma forma geral, anda a passos lentos e tem se tornado cada vez mais uma das principais preocupações dos gestores em todos os governos, em todas as esferas. Não se realiza campanha pré-eleitoral sem falar em saúde. Como citado, não se vive sem saúde. Certamente pela complexidade que envolve a vida, talvez pela ignorância em não saber estabelecer prioridades na questão ou não abrir os olhos para o campo primário, ainda não se chegou ao patamar estabelecido pelas leis orgânicas que norteiam o grande SUS. Aguardemos, então, de forma esperançosa, o dia em que haverá universalidade, equidade e integralidade da atenção à saúde. E que as gestões se energizem a favor.
Drª Leila Lessa é fisioterapeuta generalista formada pela Universidade Estácio (Faculdade de Alagoas – FAL), pós-graduada em Docência do Ensino Superior pela Universidade Paulista (UNIP/São Paulo), especializando em Acupuntura – Medicina Tradicional Chinesa.