Militantes sergipanos perseguidos e torturados durante a ditadura militar, mais uma vez, ultrapassaram a densa memória e participar, na noite da última quinta-feira, 7, do lançamento da Comissão da Verdade dos Petroleiros de Sergipe. Entre os presentes, o vice-governador Jackson Barreto, preso e processado na Operação Cajueiro, em 1976. A solenidade contou com a presença de Goizinho, Milton Coelho, Marcélio Bonfim, César Brito e Iran Barbosa.
Organizada pelo Sindicato Unificado dos Trabalhadores Petroleiros, Petroquímicos, Químicos e Plásticos nos Estados de Alagoas e Sergipe (Sindipetro AL/SE), a Comissão visa contribuir para as investigações sobre os crimes da ditadura militar e estabelecer um Termo de Cooperação com a Comissão Nacional da Verdade, como explicou o diretor da entidade, Deyvis Barros.
“Inicialmente, montamos uma comissão para investigar os casos de perseguição política e de apoio que a Petrobras possa ter oferecido à ditadura militar no Brasil. Como Sergipe e Alagoas não possuem Comissão da Verdade, passamos a discutir o tema com pessoas que sofreram durante o período, como o petroleiro Milton Coelho, Goizinho e hoje estamos lançando essa Comissão com os objetivos de cobrar reparação para as pessoas que sofreram perseguição política e solicitar que os Estados de Sergipe e Alagoas criem suas Comissões de Verdade. Nossa luta é para que esta violência nunca mais volte a acontecer”, disse.
“Fico muito feliz com este ato, mas lamentavelmente tivemos uma lei de Anistia que considero lei de esquecimento, na qual os torturadores foram deixados de lado. Temos que passar a limpo a história, precisamos apontar os nomes daqueles que foram responsáveis pelos momentos mais negros e difíceis da vida de nosso povo. Quais serão as conseqüências práticas da Comissão da Verdade? Sabemos que temos sobreviventes da ditadura, como Milton Coelho, Goizinho e Marcélio Bonfim. É preciso explicar nossa história”, declarou Jackson Barreto.
Para o ex-presidente da OAB nacional, Cesar Brito, o esclarecimento dos casos de tortura e mortes durante o período militar é fundamental para a consolidação da democracia brasileira.
“ Se nós queremos avançar na democracia com segurança, se não queremos repetir a ditadura militar que matava, torturava, censurava, que cassava ministros do STF, é preciso anistiar os militantes, punir severamente quem torturou e assegurar o direito à memória e à verdade. O povo que tem medo de sua história, que se acovarda diante dela, certamente irá repetirá os mesmos erros no futuro. É por isso que essa Comissão é fundamental. É por isso que os trabalhadores que foram vítimas e reagiram à ditadura precisam ter suas histórias contadas, para que a geração de hoje jamais a repita. Essa iniciativa do Sindipetro tem que ser louvada e seguida por outras entidades civis”, afirmou.
Sindicalista e ex-funcionário da Petrobras, Milton Coelho resume a truculência vivida à época do militares: aos 36 anos perdeu a visão após ser torturado nos porões da Operação Cajueiro. “Infelizmente, temos uma população pouco informada politicamente. O processo democrático precisa da participação de todos os cidadãos e a Comissão da Verdade do Sindipetro é importante para o resgate da história de Sergipe e de nosso País”, disse.
Comissão Nacional da Verdade
Em 2011, a presidenta Dilma Roussef sancionou a Lei 12528/2011, a qual instituiu a Comissão Nacional da Verdade com o objetivo de apurar graves violações de Direitos Humanos ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988. Em dois anos de trabalho, a CNV estima que 50 mil pessoas foram, de alguma forma, afetadas e tiveram direitos violados pela repressão durante a ditadura militar. O número inclui presos, exilados e torturados, mas também familiares que perderam algum parente nas ações durante o período de 1964 a 1988, além de pessoas que sofreram algum tipo de perseguição.
O relatório aponta também 150 casos de opositores do regime militar que desapareceram após serem presos ou sequestrados por agentes do Estado. Não há registro da prisão deles em nenhum tribunal ou presídio, os advogados não foram notificados e os familiares ainda procuram esclarecimentos sobre onde estão os corpos das vítimas.
Com a instalação da CNV, alguns estados brasileiros implantaram comissões estaduais com a mesma finalidade. Os estados de Pernambuco e São Paulo já possuem grupos de trabalho. No Rio de Janeiro, a comissão da Verdade será lançada na próxima segunda-feira, 11.
Nadine Borges, socióloga e membro da Comissão Nacional da Verdade, informou que a entidade tem como base o direito à memória. “A ideia é conhecer o passado se utilizando de pesquisas locais. É preciso lembrar que hoje vivemos em uma democracia, mas há pouco tempo atrás não havia liberdade de expressão e as pessoas viviam em estado de opressão”.
Operação Cajueiro
A ditadura militar implantada a partir do golpe de março de 1964 atingiu o máximo da brutalidade em Sergipe com a Operação Cajueiro, realizada em fevereiro de 1976. NA ocasião, uma força especial vinda da Bahia, sob as ordens do general linha-dura Adyr Fiúza de Castro, comandante da 6ª Região Militar, sediada em Salvador, prendeu arbitrariamente 25 sergipanos, processando 18 deles, além de processar também o então deputado estadual Jackson Barreto. As vítimas foram levadas presas e algemadas para as dependências do quartel do 28º Batalhão de Caçadores, em Aracaju, onde ocorreram as sessões de torturas físicas e psicológicas, com participação de unidades dos órgãos de segurança sediados em Sergipe.
Agência Sergipe de Notícias