Abandono é a palavra que melhor traduz a realidade das delegacias de polícia do Estado. E aqueles que ainda tinham dúvidas, ou uma noção rasa sobre o tamanho exato do problema, na manhã desta terça-feira, 8, com a apresentação de um relatório em vídeo produzido pela Associação dos Delegados de Polícia de Sergipe (Adepol/SE), puderam chegar à real conclusão de que os distritos policiais espalhados Estado adentro não passam de prédios destroçados e esquecidos pelo poder público estadual.
“Esse vídeo é fruto de um trabalho desenvolvido pela Adepol, para que o povo de Sergipe, através da imprensa, tome conhecimento da realidade das unidades policiais do nosso Estado. A Adepol não se sente feliz em mostrar essas imagens, mas reconhece que é necessário. Já sabíamos da existência dos problemas, mas não somente resolvemos constatá-los in loco, como também tivemos o dissabor de sentir o mau cheiro de cada delegacia. Sentimos na pele o que os nossos colegas enfrentam todos os dias. Essa é uma reclamação antiga da Associação, que agora chega de forma mais consistente ao conhecimento de todos”, ressaltou o delegado Kássio Viana.
A maioria dos municípios visitados pela Adepol (nos meses de março e abril deste ano) conta com unidades policiais que não oferecem a mínima estrutura de funcionamento e de trabalho para delegados, agentes e escrivães, que são obrigados a lidar diariamente com prédios velhos, inseguros e insalubres. Além disso, há, em média, sete municípios sem a presença tão necessária dos agentes de polícia.
FALTA CONCURSO
“Infelizmente, pouca coisa tem sido feita diante das nossas reclamações. No interior do Estado há delegacias construídas há, no mínimo, seis meses, que ainda não foram inauguradas. Enquanto isso, as equipes policiais continuam trabalhando em prédios alugados e totalmente desestruturados. A Polícia Civil necessita urgentemente de mais 500 policiais para reforçar o seu quadro, mas não existe nenhuma sinalização de concurso até agora”, lamenta Viana.
O presidente da Adepol lembra que em 2009, quando a Superintendência da Polícia Civil estava sendo dirigida pelo delegado Gilberto Passos, foi apresentado um relatório completo sobre a situação de pessoal da PC, incluindo a lotação de cada delegado, agente e escrivão de polícia e respectiva projeção de aposentadoria. “Recordo-me bem que, naquela época, mais de 50% dos policiais de Sergipe tinham entre 45 e 50 anos, ou seja, estavam perto de se aposentar. De lá para cá, nada de sinalização de concurso”, ressalta Kássio Viana.
QUADRO ATUAL
Atualmente, a Polícia Civil de Sergipe funciona com 142 delegados, destes, 58 estão lotados nos municípios, que contam com somente 60 escrivães e 301 agentes de polícia. “Sabemos que houve investimento na Segurança Pública do Estado, sim, mas analisamos da seguinte forma: se o Governo investiu tanto em um setor no qual a violência está crescendo, é sinal de que as coisas não estão funcionando bem. É necessário localizar o erro, discutir esses assuntos com a Polícia Civil, a Polícia Militar, as secretarias de Ação Social e de Educação, para, então, consolidar um núcleo de combate à violência”, sugere Kássio Viana.
Outra preocupação da Adepol está centrada na superlotação de celas nas delegacias que, segundo o presidente da Adepol, não deveriam custodiar presos. Ao todo, há 118 encarcerados no interior e 178 nas delegacias metropolitanas. Como se isso não bastasse, há muitos casos de unidades policiais sem espaço para banho de sol.
“As delegacias reformadas contam com celas com portas de aço e apenas uma faixa vertical de ventilação. A quarta Delegacia Metropolitana (localizada no Augusto Franco), por exemplo, foi inspecionada pela representante do Conselho Nacional de Justiça, que destacou ser aquela uma das piores já visitadas por sua equipe. Isso é um absurdo!”, denuncia Viana.
GALINHEIRO E POCILGA
Outro grande problema apontado pela Adepol está no fato de haver delegados trabalhando em até três distritos policiais. Encontram-se nessa situação os municípios de Canhoba, Amparo de São Francisco, Telha, Muribeca, Aquidabã, Rosário do Catete, General Maynard, Feira Nova, Graccho Cardoso e Cumbe. Muitas vezes, mesmo acumulando delegacias, os delegados trabalham sem agentes de polícia.
Renato Oliveira, delegado titular de Muribeca, está prestes a assumir também a delegacia de Aquidabã, ambas com vários problemas estruturais. Segundo ele, a situação enfrentada cotidianamente por sua equipe é bem pior do que as imagens apontam. “Em Muribeca, a situação é pra lá de precária. A delegacia divide espaço com um galinheiro e uma pocilga. Pode-se dizer, sem sombra de dúvida, que a população local, bem como os policiais que trabalham todos os dias naquele local insalubre, são tratados com uma falta de respeito fora do comum”, desabafa o delegado.
OAB/SERGIPE
O advogado Cláudio Miguel Oliveira, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em Sergipe, participou do evento e informou que já chegou ao conhecimento da OAB/SE a situação das delegacias e presídios do Estado. “Quando o CNJ esteve inspecionando Sergipe, seus representantes levaram uma péssima impressão sobre a forma como Sergipe tem administrado esses locais. Saindo daqui, farei um relatório sobre todas as explanações da Adepol e entregarei ao presidente da OAB/SE, Carlos Augusto Nascimento, que tomará medidas junto aos poderes Judiciário e Público”, informou Cláudio Miguel.
Alessandra Cavalcanti – Assessoria de Comunicação