Preocupada em aparecer mais que Lindemberg Alves Fernandes, seu cliente, Ana Lúcia Assad tem pretensões políticas em Guarulhos
Cabelos negros, longos e encaracolados, brincos compridos de strass e roupas justas que marcavam a silhueta curvilínea. A advogada Ana Lúcia Assad foi a personagem que mais chamou a atenção da plateia nos quatro dias de julgamento de Lindemberg Alves. Ele foi condenado nesta quinta-feira a 98 anos e dez meses de prisão pela morte de Eloá Pimentel em 2008. Cumprirá 27 deles em regime fechado.
Equilibrando-se sobre um salto agulha de 15 centímetros que sustentava sandálias também enfeitadas com strass, Ana Lúcia desfilou pelo plenário do Tribunal do Júri do Fórum de Santo André, no ABC Paulista, distribuindo afagos ao cliente, farpas à promotora Daniela Hashimoto e conselhos à juíza Milena Dias. “A senhora devia ler mais. Voltar a estudar”, fustigou, num dos momentos mais tensos do julgamento, quando Milena disse desconhecer o “princípio da verdade real”, invocado por Ana Lúcia para que pudesse inquirir novamente uma das testemunhas. A grosseria pode render à advogada um processo por injúria e difamação, solicitado ao Ministério Público pela juíza ao final do julgamento.
Advogada inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil, secção de São Paulo, com o número 172.656, Ana Lúcia formou-se em Direito pelas Faculdades Integradas de Guarulhos (FIG) – ironicamente, Alexandre Nardoni, condenado pela morte da filha Isabela Nardoni, estudou na mesma instituição – e fez pós-graduação em Direito Tributário na Escola Paulista de Direito. Hoje, é membro da comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, subseção de Guarulhos.
De acordo com o site do escritório “Assad Advocacia”, localizado em Guarulhos, na Grande São Paulo, ela atua nas áreas do Direito Criminal, Civil, Tributário e Previdenciário, “sendo sua destacada especialidade a atuação no Tribunal do Júri”. E que atuação.
No primeiro dia do julgamento de Lindemberg, Ana ameaçou abandonar o tribunal caso não conseguisse arrolar entre as testemunhas Ana Cristina Pimentel, mãe de Eloá, e Everton Douglas, irmão caçula da vítima. À tarde, chamou de mentirosa Nayara Rodrigues da Silva, amiga de Eloá que também esteve sob a mira da arma de Lindemberg, e afirmou que a jovem havia sido instruída pelo advogado a chorar durante o depoimento.
O bate-boca com o advogado José Beraldo, assistente da acusação, também começou na segunda-feira – e se estendeu até quinta. Ao acusá-lo de especular sobre o caso, ouviu a réplica em voz alta: “A doutora, por favor, fique quieta. A senhora está me atrapalhando”. Ana Lúcia respondeu pedindo respeito. “Pare de gritar no plenário”, repreendeu-a Beraldo. “Quando o senhor me respeitar eu paro”, devolveu Ana Lúcia no mesmo tom de voz.
A discriminação de que se dizia vítima, por parte da promotoria, da juíza, dos jornalistas e da população em geral tinha, segundo Ana Lúcia, uma prova concreta: a falta de um microfone exclusivo para uso em plenário. Visivelmente incomodada com o detalhe, fez questão durante todo o julgamento de mostrar que o microfone que lhe ofereciam não funcionava ou estava sempre fora do alcance – além de, propositalmente ou não, bater seguidamente com o equipamento na mesa ou nas mãos, provocando estrondos na sala do júri.
Ao evocar os mais de 250 casos nos quais atuou, preferiu não revelar em quantos foi vitoriosa. “Depende muito do que você considera ganhar ou perder”, esquivou-se. “Mesmo sem ganhar o caso, você pode ter pequenas conquistas que equivalem a uma vitória”.
Na terça-feira, foi vaiada pelos espectadores que acompanhavam o julgamento ao novamente ameaçar retirar-se do tribunal – desta vez porque queria dispensar o testemunho de Ana Cristina e Everton Douglas. Um jornalista perguntou-lhe se a estratégia havia sido uma “jogada de mestre”, já que resultara no afastamento da mãe de Eloá da plateia, respondeu: “Não sei se foi uma jogada de mestre, mas agradeço o elogio”.
O clímax da performance chegou quando Ana Lúcia foi hostilizada por um grupo de pessoas que acompanhavam o julgamento do lado de fora do Fórum. Tal reação é frequente em casos de grande repercussão – em 2008, por exemplo, foram apedrejados os carros dos advogados do casal Nardoni. Depois disso, a advogada começou a se apresentar como vítima de uma orquestração montada para impedi-la de exercer a profissão.
“Não é crime ter gênio forte”, disse a certa altura, referindo-se a Lindemberg. “Se fosse, eu estava bem complicada.” Para livrar-se da multidão hostil, Ana Lúcia contou com a escolta de uma equipe da Força Tática da Polícia Militar. Para protegê-la dentro do tribunal, convocou um time de advogados da OAB de Santo André e de integrantes da Comissão de Prerrogativas da Ordem, que fiscaliza se os direitos dos advogados estão sendo preservados.
Com tantos holofotes, Ana Lúcia não perdeu nenhuma chance para se projetar. Os tiros saíram pela culatra. A postura geniosa desagradou a juíza, os jurados e a plateia. Lindemberg acabou condenado nos doze crimes dos quais era acusado, e enquadrado na pena máxima.
Se prejudicou o cliente, o desempenho pouco polido diante do júri e das câmeras serviu para dar visibilidade a Ana Lúcia – algo que ela perseguia desde a abertura do julgamento. Em sua página no Facebook ela aparece, sorridente e decotada, posando ao lado do prefeito de Guarulhos, Sebastião Alves de Almeida (PT), e do vereador Unaldo Santos (PSB). Na rede social, um amigo lhe perguntou se será candidata a algum cargo público. A resposta: “Sabe que é uma boa idéia? Pré-candidata!!!” Aparecer ela conseguiu. Se vai ser bom ou ruim para suas pretensões eleitorais, isso só as urnas saberão dizer.
Branca Nunes e Carolina Freitas – Veja.Com