Deputados federais de diferentes partidos pedem a devolução da medida provisória que atribui ao ministro da Educação, Abraham Weintraub, a função de nomear reitores de instituições federais de ensino durante a emergência de saúde pública provocada pela crise sanitária de coronavírus (MP 979/2020).Publicada nesta quarta-feira (10), a MP dispensa a consulta à comunidade acadêmica ou escolar durante o período de calamidade pública, até o dia 31 de dezembro deste ano.
Segundo o texto, que já está em vigor, mas ainda precisa ser referendado pelo Congresso, também não será formada lista tríplice para escolha dos dirigentes. Ao fim da crise sanitária será necessária consulta à comunidade para a nomeação dos novos dirigentes.O líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), classificou a medida como um retrocesso. “A definição da direção de escolas e universidades é uma questão muito relevante e deve ser discutida levando-se em consideração o caráter técnico das indicações e a participação da comunidade acadêmica. Fazê-la puramente por indicação política não é a solução”, afirmou o líder.
As bancadas do Psol, PCdoB, PT, PSB, PDT e Rede protocolaram ofício (íntegra) cobrando do presidente do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), a devolução da MP 979, com a justificativa de que o governo se aproveita de uma pandemia para intervir nas instituições de ensino.
A medida foi interpretada como intervenção pela líder do PCdoB, deputada Perpétua Almeida (AC). “Bolsonaro quer acabar com a eleição de reitores. Não aceitaremos interferência na autonomia universitária. É um duro golpe na autonomia universitária. O nome disso é intervenção”, afirmou ela.
O mesmo movimento foi indicado por deputados ligados às Frentes Parlamentares em Defesa da Valorização das Universidades e dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Eles alegam que o texto é inconstitucional por ferir o artigo 207 da Constituição Federal, que trata sobre a autonomia das universidades.
“Esse é mais um duro ataque à educação brasileira O texto é um total rompimento do princípio da autonomia das universidades e institutos federais”, criticou o deputado federal Danilo Cabral (PSB-PE), um dos coordenadores da Frente Parlamentar em Defesa das Universidades.
“As Universidades e Institutos são produtores do conhecimento. Não podem ser tutelados. A autonomia é um princípio que está na Constituição Federal”, disse a deputada Margarida Salomão (PT-MG), também coordenadora da Frente Parlamentar, que já foi reitora da Universidade Federal de Juiz de Fora.
Insegurança institucional
Deputados da Comissão Externa de Acompanhamento do Ministério da Educação (Comex/MEC) também se posicionaram contra a MP 979. Em nota (íntegra), eles afirmam que o Poder Executivo demonstra autoritarismo e desrespeito à comunidade acadêmica e ao Congresso Nacional. Além disso, afirmam que a MP gera insegurança institucional, comprometendo não apenas a confiança entre as instituições de ensino e o governo federal, mas também a estabilidade para organização interna das instituições e de seus projetos.
A comissão, composta por deputados de partidos como PSB, Novo, PTB e PDT, sugere ao MEC a possibilidade de realizar uma consulta com a comunidade acadêmica para discutir o processo de escolha de reitores por meio remoto ou prorrogar as eleições, mantendo os reitores já eleitos em seus respectivos cargos enquanto durar a pandemia do novo coronavírus.
Ação judicial
Pela via judicial, oito partidos – Psol, PCdoB, PT, PSB, PDT, Rede, Partido Verde e Cidadania – ingressaram com uma Ação Direta da Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) para a suspensão imediata dos efeitos da medida provisória.
“Além de ser claramente inconstitucional, essa MP representa mais um ataque do governo federal às universidades, à democracia e à liberdade da comunidade acadêmica em escolher seus gestores”, afirma a líder da bancada do Psol, Fernanda Melchionna (RS). “É um ato arbitrário, aliás bastante utilizado durante a ditadura civil-militar, colocar reitores biônicos para controlar a produção da ciência e do conhecimento e a gestão das universidades e institutos federais. Isso é inadmissível”.
Reedição de MP
É a segunda MP que o governo edita sobre o tema. Em dezembro do ano passado, Bolsonaro e Weintraub assinaram uma medida que dava menos peso à consulta acadêmica para escolha de reitores nas universidades públicas. A iniciativa nunca fui analisada pelo Congresso e deixou de valer. Parlamentares apontam que a reedição também é inconstitucional.
A MP poderá atingir 17 universidade e quatro institutos federais de ensino, que têm dirigentes com mandatos que vencem neste ano. As universidades escolhem seus reitores através da consulta à comunidade acadêmica para a formação de uma lista tríplice. Já para os institutos federais os reitores são eleitos de forma direta, prevista numa lei federal.
Danilo Cabral lembra que o processo de escolha dos reitores pelas próprias instituições não fica inviabilizado em função da pandemia. O deputado citou o exemplo da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), cujo Conselho Universitário aprovou, em maio, a realização da eleição remotamente, através do Sistema Helios Voting. O software, desenvolvido pelo Instituto de Tecnologia Massachusetts (Estados Unidos), já foi utilizado no Brasil nas eleições de reitor na Universidade de São Paulo. O mandato do atual reitor da instituição termina em outubro.
O texto da MP 979 foi discutido na manhã de hoje (10) em reunião dos parlamentares com as entidades ligadas à educação, como Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior), Conif (Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológico) e da União Nacional dos Estudantes (UNE). No encontro virtual, também ficou decidido que será impetrada uma ação judicial no Supremo Tribunal Federal para sustar os efeitos do texto imediatamente.
Por Congresso em foco
Acompanhe também o SE Notícias no Twitter, Facebook e no Instagram