De acordo com dados compilados no Dossiê Violência Contra as Mulheres no Brasil, trabalho realizado pela organização Agência Patrícia Galvão, a cada 11 minutos uma mulher é estuprada; cinco espancamentos acontecem a cada dois minutos; um feminicídio é praticado a cada 90 minutos; 179 casos de agressão são relatados diariamente. Os dados gritantes colocam o país em 5º lugar no ranking de nações que mais cometem crimes contra o gênero feminino. Dados estes que hoje não demonstram números específicos quando o assunto são as agressões lesbofóbicas.
Hoje, 29 de agosto, é comemorado o Dia da Visibilidade Lésbica. A data, criada em 1996, marca o dia em que aconteceu o 1º Seminário Nacional de Lésbicas e Bissexuais (Senale), no Rio de Janeiro. Embora existam questões comuns ao mundo LGBT, especificar as reivindicações de cada grupo é importante. Principalmente quando o assunto em questão é a mulher lésbica, grande alvo de violências físicas, sexuais, psicológicas e econômicas em espaços privados e públicos.
Para a presidente do Movimento de Lésbicas de Sergipe (MOLS), Ednalva Monteiro, a invisibilização é movida por motivos que permeiam a opressão de uma sociedade patriarcal, machista e heteronormativa que é determinante na escolha do papel da mulher como extensão do patrimônio do homem.
“Assumir a lesbianidade transcende a identidade sexual, ela acaba sendo um ato político. Mas não há como assumir um posicionamento diante do medo da punição social pelo simples fato de existir. As políticas públicas têm um papel fundamental no desenho de um novo cenário, já que é através da educação, em seus diversos campos, que trabalha com as diferenças como algo normal. Nós só temos medo do que não conhecemos”, pondera Ednalva.
À frente da Diretoria de Direitos Humanos da Secretaria Municipal da Assistência Social de Aracaju, Lídia Anjos endossa o discurso da presidente do MOLS. “Infelizmente nós somos criados dentro de uma educação de gênero onde a mulher ainda é a figura mais invisibilizada. Quando afunilamos essas características, a exemplo de uma mulher lésbica, negra, periférica e trans, chegamos numa situação ainda maior de vulnerabilidade. Os crimes de ódio que acontecem deixam um recado muito claro de que é preciso mais do que matar, é preciso punir e exterminar.”
Lídia ainda fala sobre as ações que vêm sendo desenvolvidas através da administração a fim de quebrar as barreiras do preconceito. “Nós temos levado este debate para todos os equipamentos da própria Assistência, visando tanto um melhor atendimento à população, quanto melhor qualificação para os nossos trabalhadores. Mas isso não fica apenas dentro da Assistência. Estamos integrados, intersetorialmente, com as secretarias da Saúde, Educação, Esporte e Lazer, Trabalho, Cultura, entre tantos outros, para levar capacitação e entendimento sobre tudo que envolve o respeito à comunidade LGBT”.
Ato revolucionário
“Quando eu era pequena, lembro que no colégio mandei uma cartinha para uma coleguinha, falando sobre gostar muito dela. A escola inteira ficou falando disso, mas foi considerada uma fase e eu continuei vivendo. Até que um dia, após um relacionamento que tive já perto dos 30 anos, eu vi que não era aquilo que me contemplava. A partir de então, comecei a me relacionar com mulheres e me entendi como lésbica. A militância entrou na minha vida através dos meus amigos e hoje eu vejo que amar outra mulher é um ato revolucionário”, confessou Ednalva.
Em um mundo ideal, entender a própria orientação bastaria para ser feliz, mas não é bem assim que acontece. Segundo Ednalva, mulheres lésbicas acabam sendo perseguidas pela negação da sexualidade dependente de um homem. “O ódio como somos tratadas, como se quiséssemos ‘roubar’ o lugar dos homens, é impressionante. Ouço relatos constantemente de lésbicas que apanharam na rua ou em casa por causa da sua orientação, que sofreram tentativas ou até mesmo que chegaram a ser vítimas de estupro corretivo. Não há como corrigir o que não está errado, pois ser lésbica não é doença. Não falar sobre isso é continuar nos colocando por baixo de uma capa da invisibilidade”.
Orgulho L
Bianca Silva tem 25 anos, é estudante de Serviço Social e lésbica assumida desde os 17 anos de idade. Ela afirma que, mesmo com todo o cenário contrário, resistir é preciso. “Depois que me assumi, nunca mais senti os olhares tortos para mim, mas entendo que muito disso vem da minha posição de privilégio por ser uma mulher branca e de classe média. E, mesmo assim, ainda corro riscos. O apoio da minha família e o amor da minha mãe, acima de tudo, foram muito importantes para que eu entendesse que não há nada de mais em ser quem eu sou. Como todo mundo já sabe, acredito muito que educar é o melhor caminho. Ninguém deveria se importar com quem o outro ama ou deixa de amar”.
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Por AAN