por Caio Barretto Briso, O Globo
Uma semana após assumir o cargo de secretário municipal da Casa Civil, Marcelo Hodge, filho do prefeito, teve sua nomeação suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro Marco Aurélio Mello considerou nepotismo a escolha feita por Marcelo Crivella. A decisão tem efeito imediato, mas a prefeitura ainda não recebeu a notificação. Quando isso ocorrer, ela deverá recorrer ao plenário do STF.
Autor da ação civil pública que deu origem à liminar, o advogado constitucionalista Victor Rosa Travancas afirmou que “se o ministro permitisse que Crivella, numa cidade grande como o Rio, mantivesse o próprio filho nomeado, estaria legitimando e incentivando a prática de indicação de parentes a cargos de primeiro escalão”.
Quando a nomeação de Marcelo Hodge, conhecido como Marcelinho, foi publicada no Diário Oficial, quinta-feira passada, o prefeito defendeu sua escolha em entrevista ao GLOBO:
— Você precisa entender que ninguém conhece melhor meu filho do que eu, e quem nomeia sou eu, não precisa se preocupar com isso, não.
Segundo Travancas, o prefeito não justificou a nomeação do filho, pois não o apontou como o mais capacitado para assumir a Casa Civil nem descreveu sua qualificação técnica.
— A função pública deve ser exercida pelos melhores. Nenhum cidadão concorda que um governante nomeie um filho para trabalhar. É uma atitude que agride o bom senso. Não tenho nada contra o filho de Crivella, parece ser uma pessoa de bem. O problema é do ponto de vista jurídico. Se isso acontecer no Rio de Janeiro, pode se multiplicar em todo o país — argumentou o advogado. — É um mau exemplo político, e a sociedade brasileira clama por bons exemplos.
Travancas afirmou que apresentará uma outra ação civil pública, na qual pedirá a anulação de todos os atos de Marcelo Hodge como secretário municipal e a devolução de seu salário, caso tenha recebido. O advogado também cobrará na Justiça o reembolso para os cofres do município de eventuais gastos do filho do prefeito na secretaria.
Ao colocar Marcelo Hodge na prefeitura, Crivella se apoiou na Súmula Vinculante 13, do STF, que não considera nepotismo a nomeação de parentes e cônjuges para cargos políticos de primeiro escalão — secretários, no caso de municípios e governos estaduais; e ministros, no caso da União. Mas, nos últimos anos, o STF interpretou ações desse tipo de forma diferente.
ADVOGADO DEFENDE REVISÃO DE SÚMULA
Em 2014, em decisão monocrática que não considerou ilegal a nomeação do irmão da então vice-prefeita de Pinheiral, a 135 km da capital, para o cargo de secretário de Administração daquele município, o ministro do STF Luís Roberto Barroso afirmou que alguns de seus colegas “observaram que a caracterização do nepotismo não estaria afastada em todo e qualquer caso de nomeação para cargo político, cabendo examinar cada situação com a cautela necessária”. Ele se referia, entre outros, à ministra Cármen Lúcia, atual presidente do Supremo.
O advogado constitucionalista Erick Wilson Pereira, que atua em Brasília, defendeu que haja uma revisão da Súmula Vinculante 13, criada de 2008:
— Infelizmente, nós temos essa exceção, com relação a cargos políticos de primeiro escalão, na qual se enquadram secretários. Acredito que tem que haver uma revisão dessa lei. Embora não seja considerado nepotismo, considero uma distinção injusta beneficiar alguém não pela qualidade técnica, mas pela condição de parente.
A Súmula Vinculante 13 é amparada na Resolução nº 7 do Conselho Nacional de Justiça, criada três anos antes pelo então presidente do órgão, Nelson Jobim, para impedir nomeações de parentes em todas as esferas da Justiça. A exceção ficaria por conta de admitidos por concurso público que tenham carreiras jurídicas, que não fiquem subordinados a quem os nomeou e, ainda, respeitando a “qualificação profissional do servidor e a complexidade inerente ao cargo em comissão a ser exercido”. Segundo Erick Wilson Pereira, antes da mudança, “o Poder Judiciário estava desenfreado, e a Resolução nº 7 gerou a Súmula Vinculante 13”.
Nesta quinta-feira, horas após ter sua nomeação suspensa, Marcelo Hodge publicou uma foto em uma rede social na qual aparece em uma reunião na sede administrativa da prefeitura. Embaixo da imagem, uma mensagem: “Acredito que compromisso é participação. Se dermos a chance de todos participarem, criamos a possibilidade de todos se comprometerem”.
Em nota, o prefeito se manifestou sobre a decisão do ministro Marco Aurélio Mello: “Eu dei o melhor que tinha para a prefeitura. Confio na Justiça”. Ele disse ainda que o filho tem formação superior, mestrado em Oxford e está apto para exercer a função de secretário da Casa Civil.
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