Quando “Falsa Loura”, de Carlos Reichenbach, foi lançado nos cinemas, em abril de 2008, o filme atraiu cerca de 12 mil espectadores, deixando o diretor deprimido. O cineasta, morto em junho passado, achava que tinha feito um longa popular. Talvez estivesse certo.
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“Falsa Loura” virou hit no YouTube, com cerca de 470 mil visualizações. O problema? A cópia no canal é ilegal. “Estou surpresa com a notícia. Quisera eu que o longa tivesse feito 400 mil espectadores”, diz uma atônita Sara Silveira, produtora do filme.
Com esses números, “Falsa Loura”, que ganhou impulso on-line por ter uma cena de nudez de Rosanne Mulholland, a professora Helena da novela “Carrossel”, ficaria em sexto lugar nas bilheterias daquele ano.
“Carlão estaria contente, porque ele queria que seus filmes fossem vistos, mas não ganhamos um tostão e pode atrapalhar as vendas das obras para a TV. Ainda não sei qual ação tomarei. Vou falar com meu advogado”, diz Silveira.
O longa de Reichenbach, no entanto, é apenas a ponta do iceberg.
Filmes nacionais estão completos no YouTube há algum tempo, mas agora foram compilados em uma única página, administrada pelo bacharel em filosofia pela USP Eduardo Carli de Morais, que mora em Goiânia e mantém blogs culturais.
“Eu mesmo não tenho o costume de fazer upload de filmes, porque a situação da contenda entre direitos autorais versus cultura livre ainda não está clara”, explica Carli.
Não é a opinião do advogado Caio Mariano, da Senna & Mariano Advogados: “Não há um ‘lugar cinza’. É uma forma de disponibilização da obra tal qual qualquer outra realizada em cinema, TV, DVD e afins. Tais direitos são de prerrogativa dos distribuidores ou produtores da obra audiovisual”.
O canal reúne mais de 150 filmes nacionais completos, de raridades como “A Hora e a Vez de Augusto Matraga” (1965), de Roberto Santos, a novidades como “Paraísos Artificiais”, de Marcos Prado, lançado há três meses.
“Pela rapidez com que retiram os vídeos, acho que não teremos problemas, mas vamos discutir se haverá uma ação legal”, adianta Dodô Brandão, presidente da Associação Brasileira de Cineastas, que, apesar de ter enviado ofício à Ancine pedindo “punição”, sabe que o caso é mais complicado. “Sou contra colocar filmes completos, mas alguns autores podem gostar da exposição.”
É o caso de Rudi Lagemann, cujo drama “Anjos do Sol”, 2006, foi visto por apenas 30 mil pessoas nos cinemas e já ganhou 166 mil espectadores no YouTube.
“Fico feliz. É ruim quando o vazamento acontece no lançamento, mas meu longa já deu o que tinha de dar. Há outras pessoas que respondem pelos direitos e podem mandar tirar. Eu não vejo problema. A internet precisa ser nossa parceira”, afirma o diretor.
Mas outros diretores e produtores não gostaram de ver os seus longas disponíveis de graça no YouTube, que é parte do gigante Google. “É um absurdo, porque é preciso respeitar o mercado e a janela de lançamento. Acho que as pessoas precisam ter acesso à cultura, mas não pode ser leviano”, reclama Marcos Prado, que conseguiu retirar em 24 horas o seu longa “Paraísos Artificiais”, que acaba de sair em blu-ray, DVD e na loja do iTunes.
Atitude semelhante é adotada pela empresa que administra os direitos autorais das obras de Glauber Rocha, um dos cineastas com mais filmes no canal –há até uma versão italiana de “O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro”, de 1969.
“O acervo inteiro de Glauber Rocha está disponível na Cinemateca Brasileira para quem quiser ver. Vamos analisar e vamos pedir para ser retirado, mas não queremos colocar ninguém na cadeia, apenas lembrar que é preciso autorização para exibir esses filmes”, afirma Silvia Gandelman, advogada e administradora dos direitos autorais das obras de Glauber Rocha.
No caso de uma reclamação dos donos dos direitos autorais, o Google verifica o vídeo, retira a obra, notifica o usuário, que pode até perder sua conta. Por meio de sua assessoria de imprensa, a empresa diz que “respeita os direitos autorais e trabalhou fortemente para criar ferramentas para combater a pirataria”, referindo-se ao investimento de US$ 30 milhões (R$ 60 milhões) no ContentID, ferramenta que identifica um conteúdo digital protegido por copyright.
“Não cheguei a receber nenhuma notificação do YouTube por ter criado este canal. Só recebo o informe quando um vídeo que integra alguma de minhas listas é excluído. Só hoje, 10 filmes foram excluídos. Se a tendência continuar, grande parte desse material que agora está disponível será ‘exterminado'”, conta Eduardo Carli de Morais, completando: “Pelo menos até que brote de outro usuário”.
RODRIGO SALEM DE SÃO PAULO - UOL